A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) iniciou um processo para apurar a exigência de alguns planos de saúde para que mulheres apresentem um documento de consentimento dos maridos autorizando a inserção do dispositivo intrauterino (DIU).

O DIU é um dos métodos contraceptivos mais usados pelas mulheres. Além de prevenir gestações, ele também é indicado para diminuir o sangramento, a cólica e tratar a endometriose.

Uma investigação do jornal Folha de S. Paulo mostrou que a exigência de autorização dos maridos estava sendo feita pelas cooperativas da Unimed João Monlevade e Divinópolis, em Minas Gerais, e Ourinhos, no interior de São Paulo. Juntas, elas atendem mais de 50 municípios.

Segundo nota da ANS enviada ao Metrópoles nesta quinta-feira (5/8), os procedimentos de implante de DIU hormonal e não hormonal não possuem “diretriz de utilização”, isso significa que a inserção dos dispositivos é de cobertura obrigatória pelos planos de saúde sempre que forem solicitados pelo médico da beneficiária. Não há necessidade de informações ou documentos adicionais.

A ANS esclarece ainda que, “embora a operadora possa eventualmente solicitar informações adicionais sobre a condição clínica da beneficiária, ela não pode negar cobertura em razão da ausência dessas informações complementares”. Os planos de saúde que se negarem a autorizar o procedimento podem ser multados em R$ 80 mil.

A Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) entende que a contracepção é um direito reprodutivo das mulheres, que devem ter autonomia de decisão. Tal medida pode ser, também, um complicador para o controle de natalidade. A entidade confirmou que entrará em contato com a ANS para apresentar um posicionamento e pedir providências.

“O DIU é um método anticoncepcional muito eficaz, seguro e é uma estratégia extremamente importante para diminuir a gravidez não planejada. Tudo o que for um complicador da utilização do DIU vai prejudicar a vida das mulheres em um país que tem taxas muito altas de gravidez não planejada e de mortalidade materna”, afirma Agnaldo Lopes, presidente da Febrasgo.

Ana Lúcia Amorim Boaventura, professora de Direito Médico e da Saúde da Faculdade de Medicina da PUC – GO, afirma que não há respaldo jurídico para a exigência do documento pelos planos de saúde.

A Lei do Planejamento Familiar (nº 9.263, de 1996) prevê o consentimento do cônjuge apenas para métodos de esterilização – laqueadura tubária e vasectomia. O DIU, no entanto, não causa a infertilidade definitiva das mulheres. Essa mesma lei inclui outros requisitos, como o prazo de 60 dias entre a manifestação de vontade até o procedimento cirúrgico, e a pessoa ter, no mínimo, dois filhos vivos.

“Isso é bastante criticado porque a definição de família foi muito alterada durante todos esses anos. Se você analisar sob o princípio da dignidade da pessoa humana de autodeterminação, por que essa pessoa tem que ter dois filhos vivos para decidir passar por um método de esterilização?”, questiona Boaventura.

A cooperativa de João Monlevade negou exigir o consentimento dos maridos das beneficiárias. As unidades de Divinópolis e Ourinhos informaram que abandonaram a exigência após a reportagem da Folha de S. Paulo.