A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) irá lançar diretrizes para diagnóstico e tratamento da obesidade entre usuários dos planos de saúde, quadro que vem avançando no país.

A Folha teve acesso a parte das propostas, atualmente em discussão com médicos, nutricionistas e educadores físicos, e previstas para serem implementadas ainda neste semestre.

Atualmente, 47,6 milhões de brasileiros possuem planos de saúde.

Dados da pesquisa Vigitel da Saúde Suplementar, feita pela agência com o Ministério da Saúde, apontam que cerca de um em cada cinco adultos desse grupo está obeso, um índice que cresceu 36% nos últimos sete anos.

O avanço da obesidade foi tema da série Brasil acima do peso, publicada pela Folha.

Agora, a ANS planeja criar um fluxograma para identificar pacientes com excesso de peso e indicar aos profissionais quais as medidas a serem tomadas.

"Sabemos que esses pacientes estão aí, mas quase ninguém faz diagnóstico, e quase nunca são tratados. Esses pacientes vão ser negligenciados até quando?", diz Maria Edna de Melo, da Abeso (Associação Brasileira de Estudos da Obesidade), entidade que participa da discussão.

Uma das propostas é que o cálculo do IMC (índice de massa corporal, um dos indicadores de sobrepeso e obesidade) seja realizado em todos atendimentos da rede. "No sistema de saúde, isso deveria ser regra. Mas não é", diz Melo.

Com base nesses dados, o médico pode solicitar novos exames para verificar doenças relacionadas, como hipertensão e diabetes.

A ideia é também que a operadora possa enviar recomendações ao usuário com base no diagnóstico.

Pacientes com IMC entre 25 kg/m² e 30 kg/m², por exemplo, deveriam receber orientações para reforço de hábitos saudáveis -como redução, com apoio de nutricionistas, do consumo de alimentos com alto teor de sal, açúcar e gorduras e aumento da atividade física para 150 minutos por semana.

"Não precisamos esperar chegar à obesidade. O paciente com sobrepeso já tem que ser bem orientado e direcionado a tratamento", diz a diretora de normas e habilitação de produtos da ANS, Karla Coelho.

Já para aqueles com IMC acima de 30 kg/m², a previsão é que, além de apoio para adoção de hábitos saudáveis, haja direcionamento a endocrinologistas, que podem avaliar a possibilidade de uso de medicamentos.

Hoje, esses remédios não fazem parte do rol mínimo obrigatório para oferta pelos planos -e não há previsão de mudança nesse cenário.

Segundo a ANS, no entanto, várias operadoras já oferecem medicamentos dentro de programas específicos, como forma de estimular a adesão do usuário.

Tratamentos com fitoterápicos, laxantes e hormônios não serão recomendados.

Além dos adultos, o grupo planeja medidas para controle da obesidade infantil, como incentivo ao aleitamento materno e reforço no diagnóstico do excesso de peso.

"A criança obesa tem mais chances de desenvolver obesidade também na vida adulta", diz Mônica Moretzsohn, do comitê de nutrição da Sociedade Brasileira de Pediatria, que analisa as medidas.

Neste caso, uma das propostas em discussão é o incentivo ao uso de um "cartão da criança", documento com informações nutricionais e dados de saúde, assim como já ocorre no SUS.

O modelo é semelhante ao da carteirinha de vacinação, mas com gráficos para acompanhamento do crescimento e evolução do peso.

"Antigamente se usava muito para verificar a desnutrição infantil. Agora estamos no outro lado", diz Alberto Ogata, coordenador do laboratório de inovação da Opas-ANS e membro do grupo.

"Esse cartão já existe, mas não é preenchido, e é pouco usado na saúde suplementar", diz Karla Coelho.

Segundo ela, crianças que estiverem acima do peso podem ser encaminhadas a nutricionistas e educadores físicos para acompanhamento.

Bônus a planos

De acordo com Coelho, apesar da adesão dos planos de saúde às diretrizes estabelecidas não ser obrigatória, a agência planeja dar bônus em avaliações para as operadoras que adotarem os protocolos em seus serviços.

"A ideia é atrelar ao índice de desempenho. São operadoras que participam dos programas e têm uma nota um pouco mais alta do que aquelas que não participam dessa discussão", explica.

Hoje, parte das operadoras de saúde já oferecem grupos de apoio e consultas com nutricionistas e psicólogos para tratamento da obesidade, por meio de programas próprios de promoção à saúde.

A intenção, agora, é verificar, entre as iniciativas existentes, quais modelos podem ser replicados. A previsão é que as diretrizes sejam finalizadas até novembro.