Apesar dos resultados ainda não definitivos para acabar com as ações da máfia das Órteses, Próteses e Materiais Especiais (OPMEs), médicos, operadoras e Judiciário buscam métodos alternativos para a solução dos conflitos, diminuição das cirurgias desnecessárias e  uso indevido de materiais implantáveis em pacientes. As ações de quadrilhas foram denunciadas há um ano e meio pela imprensa. Desde então, o mercado investiu esforços para garantir ao paciente um diagnóstico mais confiável, além de denunciar más condutas de fornecedores e profissionais da área de saúde.

Durante o último dia do 2º Fórum de Saúde Suplementar, realizado no Hotel Sofitel, em Copacabana, no Rio de Janeiro, as ações jurídicas envolvendo a saúde pautou o debate. A necessidade de transparência nas decisões de cirurgias com uso de OPMEs e nos preços dos materiais, além das diretrizes médicas comprovadas foram algumas das soluções que todos os profissionais defenderam, assim como efetivamente criminalizar a prática abusiva.

Representando as operadoras de planos de saúde, Irlau Machado Filho, presidente do Grupo NotreDame Intermédica, foi categórico ao afirmar que nesta situação temos que combater o roubo. “As pessoas são induzidas ao erro para uma prática ilegal. Antigamente, não denunciávamos o médico, mas em defesa do paciente, que é o que mais sofre, hoje estamos partindo para a denúncia. São poucos profissionais que acabam colocando a reputação dos demais em questionamento. Temos que combater a prática”, afirma.

Ele apresentou as ações, realizadas pela operadora, que reduziram os processos decorrentes de liminares na Justiça de 57% para 33% no último ano. Uma equipe jurídica está preparada com laudos de referência, apoio da segunda opinião médica e dos conselhos de classes e de serviços de referência para combater as indicações de cirurgias desnecessárias. Além disso, há um trabalho contínuo na descaracterização da urgência e a preparação de defesas jurídicas já prontas contra profissionais que recorrerem a esta prática.

O médico Edmond Barras, chefe do serviço de clínica e cirurgia da coluna vertebral do Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo, calcula que 60% dos casos de cirurgias em coluna são desnecessários. “A grande vítima é o paciente. Sempre que se realiza uma cirurgia sem necessidade, o resultado é ruim. Mas como duvidar do diagnóstico de um médico? É necessário que os hospitais invistam em diretrizes e evidências médicas com orientações e regulamentação de exames complementares. A formação de conselhos que possam dar um parecer sobre o procedimento também é muito eficaz na redução de erros. A decisão não deve ficar na mão de um único médico, as comissões para opiniões institucionais devem ter o envolvimento do hospital, que não deve ser conivente ao desperdício”, explica Barras.

Ele  exemplificou com o caso do Hospital Albert Einstein, em São Paulo, que obteve uma economia de R$ 100 milhões em um projeto de conselho médico para autorização de procedimentos de alta complexidade, reduzindo em 58% a necessidade de cirurgias para casos já diagnosticados, como cirúrgicos.

“Temos a dificuldade em convencer o cirurgião mudar de atitude e o paciente entender que o novo diagnóstico não é uma economia do tratamento. Mas depois das denúncias, o consumidor está mais propenso a uma segunda opinião médica”, esclarece Barras.

A Justiça do Rio Grande do Sul tem dado um bom exemplo nas soluções encontradas para auxiliar as decisões de liminares médicas, por meio da criação de uma Câmara Técnica, com um departamento médico com dedicação exclusiva, que não haja conflito de interesse.

Segundo Ney Widemann Neto, desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, é fundamental uma mudança de cultura do Judiciário: “Precisamos rever a compreensão e o entendimento da inviabilidade do médico como único conhecedor do caso. Os juízes tinham uma visão mais tradicional de sempre acreditar na boa-fé e competência do diagnóstico prescrito. Entretanto, é necessário ouvir uma segunda opinião técnica, além de entender que as solicitações nem sempre são urgentes como pedidas”.

O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, também acredita que a criação de comitês médicos encarregados de fazer a colaboração com a Justiça é a solução para os pareceres. “O juiz é leigo em medicina e acaba concedendo uma antecipação de tutela, mas o aumento da demanda é uma preocupação do Conselho Nacional de Justiça. Temos que respeitar a independência do juiz, mas fornecendo mecanismos adequados para uma segunda opinião medica independente”, afirma.

Conclusões e agenda de 2017

De acordo com José Cechin, diretor-executivo da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), o Fórum da Saúde Suplementar é um processo. “Na primeira da edição, em 2015, iniciamos uma série de discussões que culminou em três linhas de atuação que pautou o debate em 2016. Os temas foram: informação como agente de transformação; o debate na assistência e modelos de remuneração e a necessidade de rever os custos de todos os envolvidos na cadeia da Saúde Suplementar. Estes assuntos deram as linhas de ações e trabalho que foram formatando o conteúdo do segundo fórum”, explica.

Para a presidente da FenaSaúde, Solange Beatriz Palheiro Mendes, não existe uma única solução para as questões do setor. “Temos um desafio de estar engajado em um comportamento ético na busca das soluções, entendendo as falhas para buscar o aperfeiçoamento. O momento é difícil, vivemos a pior crise na saúde suplementar e na economia. Se não houver uma mudança, um verdadeiro pacto, e cada um cedendo um pouco, o setor irá morrer. Temos que nos adaptar a atual situação. Somos todos consumidores de saúde e precisamos participar ativamente da cadeia de valor e decisória. As necessidades têm que ser revistas e encaradas, assumindo novos patamares de comportamento e padrão de utilização”, conclui a presidente da Federação.

Para o curto prazo, as decisões do 2º Fórum da Saúde Suplementar são: avançar na discussão do plano acessível; aumentar as informações disponíveis para a tomada de decisão de todos os envolvidos; engajar urgentemente a sociedade, intensificar as experiências de novos modelos de remuneração, implementar novos produtos com coparticipação e franquia; aprovar o VGBL Saúde e ainda intensificar o combate às más práticas e fraudes.

No final do evento, Solange Beatriz anunciou que o 3º Fórum da Saúde Suplementar acontecerá em 2017, em São Paulo, no segundo semestre.