Dados fornecidos pela Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) dão conta de que, nos últimos dez anos, os gastos médicos sofreram um reajuste de 232%. No mesmo período, a inflação média foi de 71%, de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Ao passo que, por parte da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), os reajustes concedidos chegaram a 158%.

Por trás desses números, encontra-se uma série de fatores que geram um desequilíbrio entre as expectativas das empresas (e seus beneficiários) e as atuais condições de oferta por parte das operadoras de planos de saúde – que precisam absorver o aumento dos custos e ainda assim manter a competitividade nos valores cobrados.

Essa conta se torna ainda mais complexa tendo em vista que o número de procedimentos cresceu 6,4%, totalizando um 1,5 bilhão – como informa a FenaSaúde. Ao mesmo tempo, o setor perdeu, em dois anos, 2,7 milhões de clientes. O resultado é que de cada R$ 100 recebidos pelas operadoras, R$ 99,9 são destinados ao custeio de despesas, como mostram dados da edição de fevereiro de 2017 do Boletim da Saúde Suplementar, produzido pela federação.

Ainda segundo o levantamento, a variação da despesa assistencial per capta sofreu, em 2016, um aumento de 17% (com relação a 2015). Já o índice de sinistralidade em assistência médica encontra-se hoje num patamar de 84,4%. Sendo assim, a despesa assistencial das operadoras de planos e seguros privados de saúde aumenta, alega o setor, mais do que a receita de contraprestações.

Novas tecnologias, judicialização e aumento da expectativa de vida

Entre os principais motivos apresentados estão a expansão dos preços unitários dos materiais e medicamentos, o aumento na frequência de utilização dos serviços médico-hospitalares e o excesso de exames para detecção de doenças.

Fala-se também nos gastos com incorporação tecnológica e a chamada judicialização da saúde – termo usado para definir a busca do Judiciário como a última alternativa na obtenção de medicamentos ou tratamentos ora negados pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo levantamento do Observatório da Judicialização da Saúde Suplementar, nos primeiros cinco meses de 2017, o Tribunal de Justiça de São Paulo julgou um total de 11.713 ações contra planos de saúde – com 90% das causas favorecendo os clientes. À título de comparação, em 2011, o número de casos era 2.589.

É aqui também que o aumento da expectativa de vida cruza o caminho dos reajustes. Entre os casos mais comuns avaliados pelo Observatório estão os de pessoas prestes a completar 60 anos, faixa etária na qual as seguradoras costumam concentrar seus aumentos mais altos – já que, após essa idade, os reajustes são regulados e devem ser menores.
Tudo isso, alegam as operadoras, dificultam o equilíbrio econômico-financeiro, e esse ônus acaba sendo repassado diretamente aos contratantes – sejam empresas ou pessoas físicas.

O que pode ser diferente

Custos de saúde subirem mais do que a inflação não é uma exclusividade brasileira. Aqui, no entanto, há particularidades que desequilibram ainda mais essa balança. Entre elas está o modelo de remuneração de serviços baseado em contas abertas (conhecido como free-for-service). É ele que encarece, por exemplo, as internações, responsáveis pela metade do custo das operadoras.

A própria ANS reconhece que o modelo não condiz mais com a realidade das práticas no setor. Em nota sobre o assunto, a agência informa que uma alternativa seria pensar em remunerações pautadas no resultado, o que implicaria um trabalho de formação dos profissionais envolvidos (médicos e equipes multidisciplinares) voltado à discussão de protocolos e diretrizes clínicas.

Países que adotaram outros modelos de remuneração – como o de pagamento por diagnóstico ou DRG (sigla em inglês para “grupo de diagnósticos relacionados”) – têm conseguido conter a inflação médica e aumentar a qualidade dos serviços. O DRG, em vigor nos Estados Unidos e Europa, prevê que as internações tenham um valor predeterminado de acordo com o risco clínico do paciente. Sendo assim, os valores pagos pelos serviços hospitalares levam em conta a média de custos dos grupos e não o caso isolado de cada paciente.

Outra medida discutida por especialistas seria a criação de redes hierarquizadas por grau de complexidade, como ocorre com a saúde pública. A ideia aqui é que o paciente faça o atendimento básico antes dos eventuais procedimentos mais sofisticados, evitando desperdício. Na visão da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), esse tipo de atendimento poderia resolver até 80% dos casos no próprio consultório.