Razão de descontentamento de muitos consumidores, o índice médio de correção divulgado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para planos médicos individuais e familiares – de 13,57% – não acompanha os custos da saúde que continuam a crescer substancialmente, conforme vem alertando a FenaSaúde. Vale destacar que o impacto do aumento anual das mensalidades nos contratos pós-vigência da Lei nº 9.656/98 também varia em função da carteira, ou seja: perfis dos participantes do fundo; recorte etário desses beneficiários; distribuição geográfica dos planos; redes de prestadores de serviços médicos, se próprias ou credenciadas; entre outros aspectos.

Mas conter a escalada dos custos nessa área é, de fato, um desafio dos sistemas de saúde no mundo – privados e públicos. No Brasil, a inflação médica – que retrata a variação da despesa assistencial per capita – alcança, em média, patamar duas vezes superior à inflação geral que mede os demais preços da economia. De 2007 a 2015, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulou alta de 64,5%, enquanto a despesa assistencial per capita em saúde cresceu 129,2% – quase o dobro.

“Dessa forma, os percentuais de correção definidos pela ANS nos últimos anos não vêm sequer cobrindo as despesas assistenciais dos planos. Para se ter uma ideia, o Índice de Variação de Custos Médico-Hospitalares, do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), registrou, em 2015, a maior alta da série histórica, com crescimento de 19,3%, um resultado bem acima desse reajuste de 13,57% estipulado agora pela Agência. Por isso, e devido à importância desse serviço para o consumidor brasileiro, é preciso focar na questão da alta dos custos, sob pena de o sistema se tornar economicamente inviável num futuro bem próximo”, observa Solange Beatriz Palheiro Mendes, presidente da FenaSaúde.

Desperdícios e incorporação de inovações – Diante deste cenário, é fundamental ressaltar os principais fatores que exercem forte pressão sobre os custos: o aumento da frequência de uso dos recursos médicos estimulado pelos próprios prestadores de serviço; os desperdícios e desvios dos recursos na cadeia produtiva do setor – por exemplo, na realização de cirurgias com uso de órteses e próteses sem a real necessidade, como já denunciado e conhecido como ‘Máfia das Próteses’; a incorporação acrítica de novas tecnologias ao Rol obrigatório, nem sempre produzindo resultados para a coletividade compatíveis com seu alto preço, como alguns procedimentos quimioterápicos; o aumento frequente dos preços de materiais e medicamentos; e o modelo de remuneração dos prestadores de serviços médicos baseado no volume de procedimentos realizados. E adicionalmente, devido à conjuntura atual, há uma corrida aos serviços médicos por parte dos beneficiários que perderam emprego e mantiveram o plano por tempo determinado, o que também dispara a utilização, consequentemente, elevando os gastos.

Os números falam por si: entre 2012 e 2014, o gasto médio por consulta disparou em 21,6%, em termos reais. Já o gasto médio por internação aumentou 19,6%, no mesmo período, segundo dados da publicação Painel da Precificação, da ANS. No entanto, outro fato merece atenção. Trata-se das diferenças percentuais de ‘Custo por Exposto’ entre jovens e idosos: o exposto idoso custa 7,5 vezes mais no item ‘Exames complementares’, 5,7 vezes mais em ‘Terapias’, 6,7 vezes mais em ‘Outros atendimentos ambulatoriais’, 6,9 vezes mais nas ‘Internações’, e 7,7 vezes mais nas ‘Demais despesas assistenciais’.

A participação de beneficiários de planos de assistência médica com 60 anos ou mais idade passou de 11,1%, em dezembro de 2005, para 12,3%, em dezembro de 2015 – aumento de 1,2 ponto percentual. Por outro lado, a participação de consumidores com idades entre zero e 19 anos passou de 28,3% para 25,4%, na mesa base de comparação, com redução de 2,9 pontos percentuais. Em dezembro de 2000, para cada beneficiário com 60 anos ou mais de idade, havia 3 com idades entre 0 e 19 anos. Atualmente, essa proporção é de 2 para 1.

“Dessa forma, podemos dizer que a crise também afeta o equilíbrio do sistema de solidariedade intergeracional – faixas etárias iniciais subsidiando as dos mais longevos, que tendem a usar com constância cada vez maior os serviços médicos”, avalia Solange Beatriz. ”Essa discussão precisa envolver todos os entes da cadeia de valor da saúde e a sociedade: beneficiários, operadoras, prestadores de serviços, órgãos reguladores e Governo. Não é interessante para ninguém que planos de saúde se tornem impagáveis, tampouco elitizar o acesso ao serviço privado de saúde”, completa.

Por essas razões, no âmbito privado, a FenaSaúde defende uma reestruturação do setor, como alguns países vêm promovendo, com foco no combate aos fatores que pressionam e estimulam gastos e desperdícios. O objetivo é claro: assegurar a viabilidade econômica do sistema no médio e longo prazo.

Crise também impactou a Saúde Suplementar – A despeito dessas dificuldades, as famílias vêm sendo pressionadas pela crise econômica e nenhum segmento pode desprezar essa realidade. Esse panorama também impactou o equilíbrio do sistema de saúde suplementar. De janeiro a abril de 2016, o segmento perdeu 827 mil consumidores de planos médico-hospitalares. Entre abril de 2015 e o mesmo mês deste ano, mais de 1,5 milhão de brasileiros deixaram de ter planos de assistência médica – totalizando, atualmente, 48,4 milhões de vínculos.

O resultado negativo do setor está relacionado, principalmente, ao desempenho dos planos coletivos empresariais, ou seja, as pessoas perderam emprego e, consequentemente, o benefício da assistência privada à saúde. Nos 12 meses terminados em março, 1,9 milhão de postos de trabalho com carteira assinada foram extintos no país. Com essa redução, o estoque de empregos atingiu 39,4 milhões neste mês, queda de 4,3% em 12 meses.

Para uma melhor compreensão da recente reconfiguração, o desemprego ultrapassou a marca histórica dos 10% – chegando a mais de 11 milhões de pessoas sem vínculo empregatício em todo o país. A retração na atividade produtiva, que atingiu todos os segmentos, impactou principalmente a População Economicamente Ativa (PEA), que sofre mais com o desemprego, perdendo o benefício dos planos empresariais. Em contrapartida, os idosos – mesmo sem a possibilidade de crescimento da renda, após a aposentadoria – procuram o setor privado justamente em busca de mais segurança e melhor atendimento devido às dificuldades encontradas no setor público.

“Para a FenaSaúde, é importante chegar a uma formulação que atenda ao bom funcionamento do mercado de saúde suplementar, tanto do ponto de vista dos beneficiários quanto do equilíbrio técnico e atuarial do sistema”, destaca a presidente da FenaSaúde. “Nossa expectativa, no entanto, é que, antes do fim de 2016, o setor comece a recuperar as perdas de beneficiários, sempre contribuindo para o acesso dos cidadãos ao sistema privado de saúde, desejo da maioria da população”, finaliza.