O Ministério da Saúde enviou na semana passada à ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementa) uma proposta para regular a oferta de plano de saúde popular. A ideia é que os novos planos ofereçam cobertura mais restrita, porém, a preços mais baixos.

O “plano simplificado”, por exemplo, não prevê internação, exame de alta complexidade e nem atendimento de urgência e emergência. Ou seja, reza para não ficar doente de verdade.

Outra opção seria um plano ambulatorial mais hospitalar. O cliente teria direito a atendimento desde a atenção primária até os mais complexos. Um médico de família ou da atenção primária escolhido pelo paciente é que teria que encaminhá-lo para um especialista.

Essa organização da atenção à saúde é muito importante, funciona bem em países europeus com sistemas públicos de saúde e deveria estar em prática no SUS há muito tempo. Há vários estudos mostrando que a medida reduz desperdícios e promove uma assistência mais adequado. Mas é preciso cuidado para que o acesso a esse atendimento especializado não seja dificultado por razão de custos ou por falta de especialistas na rede.

O terceiro modelo é um regime misto de pagamento. O cliente racha a conta com o plano. A proposta é que o cliente pague 50% de consultas e exames. A coparticipação é bastante comum em sistemas públicos e privados de vários países.

Pesquisas mostram que quando as pessoas têm que arcar com parte do custo de uma consulta ou de um exame, elas pensam duas vezes antes de fazê-lo, questionam seus médicos sobre a real necessidade e tornam-se mais conscientes do custo da saúde e do uso desnecessário dos recursos. Acaba essa sensação de que a carteirinha do convênio é um “cheque em branco”.

A ideia é que o usuário tenha opções de escolha e opte pelo tipo de plano de saúde que caiba no seu bolso. Mas ele precisa saber, de antemão, que poderá ficar descoberto em muitas situações. A pergunta é: vale a pena pagar mensalmente por um plano “meia-boca” ou é melhor recorrer ao que já é seu de direito, o SUS? Ou fazer o que muitas pessoas já estão fazendo, procurar uma clínica popular e pagar pontualmente pelo serviço?

Entidades médicas e de defesa do consumidor se posicionam contra os planos populares. Dizem que a proposta só beneficiará os empresários da saúde suplementar e que não solucionará os problemas do SUS, já que os procedimentos mais complexos vão recair nas costas do sistema público. Ano passado, o ministro da Saúde, Ricardo Barros, defendeu os planos populares como forma de “aliviar o SUS”.

Os empresários estão apostando muitas fichas nesse novo filão. O setor vive uma crise sem precedentes após debandada de 2,5 milhões de usuários nos últimos dois anos em razão da crise econômica. Ao mesmo tempo, as despesas assistenciais só aumentam. Não só porque a inflação da saúde é o dobro da oficial mas também porque há muito desperdício e fraudes.

Relatório recente do IESS (Instituto de Estudos de Saúde Suplementar) estima que cerca de R$ 22,5 bilhões dos gastos das operadoras com contas hospitalares e exames, em 2015, são decorrentes de fraudes e desperdícios com procedimentos desnecessários. Isso representaria 19% do total das despesas assistenciais.

Esse parece ser o principal ralo a ser fechado. Mas isso só acontecerá com novos modelos de remuneração que premiem pela qualidade do serviço prestado e não mais pela quantidade de procedimentos realizados. A prática do “fee for service” está em desuso em todo o mundo. Ela só estimula o uso excessivo e desnecessário dos recursos em saúde e não traz mais qualidade ao cuidado do paciente.

Mas, para que a proposta avance, é preciso que todos os atores da cadeia da saúde (governos, médicos, planos de saúde, hospitais, laboratórios e indústria da saúde) façam uma auto-crítica de suas práticas, mudem procedimentos e, de verdade, sejam mais honestos. Ou será preciso também uma “Lava-Jato da saúde” para que o setor comece a se mexer nessa direção?