Em pouco mais de uma década, o número de usuários de planos que dividem com o cliente parte das despesas por atendimentos passou de 8,3 milhões, em 2007, para 24,7 milhões, neste ano.

É o caso, principalmente, de planos com coparticipação, modelo em que o usuário paga valor fixo ou percentual por cada atendimento, e de alguns com “franquia”, quando o plano não é obrigado a custear serviços até ser atingido determinado valor.

A expansão desses modelos tem ocorrido de tal forma que, em janeiro, o percentual de usuários de planos que cobram algum tipo de contrapartida pelo uso superou pela primeira vez o de clientes que pagam apenas a mensalidade, segundo dados da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), que regula o setor.

Isso significa que, enquanto em 2007 o percentual de usuários desses planos era de 22%, agora o índice já alcança 52% –a maioria em planos com coparticipação. Atualmente, cerca de um terço dos planos de saúde ofertados no país (32%) possuem mecanismos de coparticipação. Dez anos antes, esse índice era de 22%.

Para a ANS e associações que representam as operadoras, essa mudança de mercado atende a demanda de empresas que custeiam planos de saúde aos funcionários.

Isso porque planos com coparticipação, além de dividir os custos com o usuário, costumam ter mensalidade 20% menor, diz o diretor de desenvolvimento setorial da agência, Rodrigo Aguiar. “Com isso, temos mitigação na escalada de custos, e isso evita reajustes mais altos”, afirma.

Hoje, 36% dos planos coletivos empresariais têm cobrança de coparticipação ou franquia. Nos coletivos por adesão e individuais, esse percentual é de 35% e 26%.

Outro fator que explica essa mudança é tentativa das operadoras de cortar gastos, em contexto de queda no número de usuários nos últimos anos e reclamações no setor sobre o volume de consultas e exames repetidos, por exemplo.

“Se a operadora pudesse repassar todo custo que tem, ficaria indiferente. Mas, quando pede reajuste, percebemos que há reclamação. A coparticipação permite que os custos cresçam menos”, afirma José Cechin, diretor-executivo da FenaSaúde, que representa as maiores operadoras.

Já para a pesquisadora do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) Ana Carolina Navarrete, o usuário precisa tomar cuidado ao aderir a esses modelos.

“A franquia e a coparticipação retiram a previsibilidade de quando se paga por mês. Mesmo que pague mensalidade mais baixa, você pode não saber quanto vai pagar. Para idosos e doentes crônicos, esse tipo de plano vai sair mais caro”, afirma.

Agora, a ANS se prepara para aprovar, ainda neste semestre, novas regras para oferta desse tipo de plano. A justificativa está nas regras atuais, tidas como “genéricas”. “Queremos estabelecer regras e limites mais claros para garantir previsibilidade”, diz Aguiar.

As medidas, porém, têm dividido entidades do setor, para quem as medidas podem trazer nova expansão do modelo e aumento dos valores pagos pelo consumidor. Uma das propostas é a definição de limites a serem pagos como taxa de coparticipação e franquia, o que não ocorre pela regra em vigor, de 1998.

Inicialmente, a proposta da agência previa coparticipação de até 40% do valor do procedimento. A medida gerou críticas pelo impacto ao usuário.

“O que se fala em coparticipação não é trazer mais clareza, mas aumento do limite”, diz Navarrete, do Idec.

Agora, a agência já analisa a possibilidade de reduzir esse valor para 30%, semelhante ao já aplicado no mercado. Em contrapartida, porém, versão da minuta mais atual do projeto prevê que esse limite possa ter aumento de até 50% em caso de acordos coletivos e convenções trabalhistas.

Já no caso da franquia, a proposta prevê que o valor pago seja equivalente ao total mensal e anual da mensalidade.

Com isso, se a mensalidade for de R$ 200, o plano ficaria isento de custear procedimentos até atingir R$ 2.400 naquele ano. Já o usuário não poderia pagar valores maiores que R$ 200 por mês (uma cobrança de R$ 400, porém, poderia ser dividida em dois meses).

A exceção valeria para alguns procedimentos preventivos, como até quatro consultas com médicos generalistas e alguns tratamentos de doenças crônicas.

Para Mário Scheffer, professor da Faculdade de Medicina da USP, a nova regra representa uma tentativa do setor de dar impulso a planos mais baratos e com menor cobertura –caso das novas regras de franquia, mecanismo que hoje abrange 7% dos usuários.

“São planos que parecem que cabem no bolso, mas, a cada utilização, vai ter problemas. Se a pessoa já busca um plano mais barato, é porque pode não ter como pagar.”

Outro problema, diz, é o risco de restringir o acesso e atrasar diagnósticos. Ou, ainda, de aumentar o custo para doentes crônicos.

Na mira das novas propostas, representantes das operadoras de planos afirmam serem favoráveis à atualização das regras como forma de aumentar as opções de escolha do consumidor. Mas questionam os limites em discussão.

“Quanto mais alta a franquia, menor a mensalidade. Se a questão é de escolha das pessoas, porque impedi-las de escolher uma franquia muito alta para ter mensalidade mais baixa?”, pergunta José Cechin, da FenaSaúde.

Para ele, valores de coparticipação também poderiam ser revistos. “Hoje aceita até 30% de coparticipação. Achamos que poderia ir além”, diz ele, para quem a concorrência pode colocar limites à oferta.

Mesma avaliação tem Reinaldo Scheibe, da Abramge, para quem mesmo tratamentos de doenças crônicas poderiam ter cobrança de coparticipação, “mas menor”.

“Tudo que é regulado demais, acaba prejudicando. Defendo que isso tudo esteja claro no contrato”, diz.