Diante da preocupação do setor em assegurar a sua sustentabilidade, a presidente da FenaSaúde, Solange Beatriz Palheiro Mendes, alerta sobre a necessidade de enfrentar hoje os impactos do aumento da longevidade para garantir o futuro da saúde privada.

O aumento da expectativa de vida dos brasileiros e a tendência de crescimento da população idosa no futuro preocupa o sistema de saúde suplementar. Em dezembro, segundo dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), mais de 6,1 milhões de clientes tinham 60 anos ou mais de idade: 12,3% do total. Cinco anos antes, no mesmo mês, a proporção era de 10,7%. Para ter ideia da evolução desse quadro ao longo do tempo, há 15 anos, para cada beneficiário com 60 anos ou mais de idade existiam outros três entre 0 e 19 anos. Em 2015, a relação diminuiu para dois jovens a cada idoso, segundo a análise da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde).

Em entrevista exclusiva ao site do CVG-SP, Solange Beatriz Palheiro Mendes, presidente da FenaSaúde, admite que essa situação é muito preocupante diante da necessidade de assegurar a sustentabilidade do setor. “Esse desequilíbrio impacta o sistema de solidariedade intergeracional – faixas etárias iniciais subsidiando as dos mais longevos, que tendem a usar com constância cada vez maior os serviços médicos”, diz. Ela explica que dentro desse pacto de mutualismo – princípio básico que rege o funcionamento dos planos de saúde –, os consumidores mais novos, que estão na vida ativa, pagam um pouco mais do que o custo médio de sua faixa etária, para que os idosos possam manter o plano.

Mas, neste cenário de desequilíbrio do sistema e aumento da longevidade, a tendência é que as despesas com saúde fiquem cada vez mais altas – fenômeno que ocorre em todo o mundo. “O envelhecimento da população brasileira certamente impactará as despesas assistenciais, porque, com a idade, aumenta a prevalência das doenças crônicas, levando o cidadão a necessitar de mais assistência médica e novas tecnologias. Esses recursos se tornam cada vez mais onerosos”, confirma Solange Beatriz.

Ela analisa que se não houver um reequilíbrio do sistema, a viabilidade do setor de saúde suplementar estará ameaçada. “Temos que resolver essa equação hoje para garantir o futuro da saúde privada, ou seja, o amanhã de um bem tão valioso para o brasileiro, como o plano de saúde”, diz. Apostando na recuperação do cenário econômico, Solange Beatriz espera que o panorama atual se reverta. “É preciso, portanto, enfrentar o impacto do aumento da longevidade no sistema de saúde brasileiro – esse fator, sim, algo que será perene”, afirma.

Segundo Solange Beatriz, a FenaSaúde vem dialogando continuamente com o Governo e as entidades de defesa do consumidor sobre esse tema. “Os diversos agentes de saúde precisarão se adaptar às mudanças já previstas”, diz. Entre as mudanças fundamentais, ela cita a necessidade de restruturação da infraestrutura física de todos os serviços, principalmente os de assistência à saúde, além de uma nova composição das especialidades profissionais, com mais ênfase em Geriatria, por exemplo.

Em outra frente, também será requerido das políticas de financiamento dos sistemas de saúde e da infraestrutura o acompanhamento dessas transformações. A começar pelas regulações adequadas para que tanto o setor público quanto o privado sejam viáveis diante do aumento das despesas médicas e previdenciárias. “Obviamente, as associadas à FenaSaúde já vêm se preparando para esse desafio, debatendo o tema setorialmente e também levando essas questões ao órgão regulador, aos legisladores e ao Executivo. Todas essas ações propiciam o fortalecimento do sistema de saúde suplementar”, diz.

Controle de reajustes não é solução

São muitas as amarras que impedem o setor de saúde suplementar de progredir e proporcionar produtos ainda mais adequados aos consumidores. A presidente da FenaSaúde elenca, entre as principais, questões como a regulação excessiva que inibe a livre iniciativa; a incorporação de procedimentos obrigatórios ao Rol, como é feita hoje, sem a análise crítica da relação custo-benefício; o modelo de remuneração dos prestadores de serviços que incentiva a superutilização dos recursos de medicina no Brasil e os desperdícios são pautas urgentes e que precisam ser discutidas pela sociedade.

Para Solange Beatriz, diante dos gargalos do setor, “mais do que mudanças em formatos dos planos de saúde é necessário enfrentar tais desafios, que são amplos e complexos”. Segundo ela, dados do Ministério da Saúde mostram, por exemplo, que um marca-passo pode custar R$ 20.523,06, no Brasil, e R$ 3.518,98, na Alemanha, para produtos com a mesma especificação. Somente um gerador do marca-passo CDI (cardioversor desfibrilador implantável) varia de R$ 29 mil a R$ 90 mil, dependendo da região do país.

Uma prótese de joelho, por exemplo, sai de fábrica por R$ 2.096. Após o implante no paciente – sem contar gastos com internação e atendimento médico – esse item chega a custar ao plano de saúde R$ 18.362. “Os exemplos apresentam distorções consideráveis que precisam ser corrigidas em benefício de toda a sociedade, principalmente dos beneficiários. Os desperdícios são exorbitantes e se refletem nos custos dos planos de saúde”, afirma.

Outro aspecto que ela menciona é a necessidade urgente de equacionamento da regulação dos planos individuais – tema sobre o qual a FenaSaúde vem alertando há tempos. “As atuais políticas – em especial, as que se referem às definições dos índices de reajuste dos planos individuais – não contribuem em nada para a expansão da oferta”, diz. Daí porque, entende que o desequilíbrio nas despesas assistenciais – e que, inevitavelmente, se reflete nas mensalidades – não encontra solução pelo controle dos reajustes. “Há inúmeros exemplos de fracasso no país dessa prática, que não faz sentindo em mercados em que prevalece a livre concorrência, como foi a trágica experiência do Sistema Financeiro da Habitação”, diz.

Por isso, de acordo com Solange Beatriz, a Federação entende que o foco deve ser nas causas que impulsionam o crescimento dos gastos, e não no seu efeito – reajuste das mensalidades. O aumento das despesas assistenciais em patamares superiores às receitas dos planos é contínuo e, na visão da dirigente, acentuam cada vez mais a pressão sobre a sustentabilidade do sistema. Ela explica que nesse cenário, o efeito do excesso de regulação, em especial a que objetiva o controle dos reajustes, é oposto. “Cria incertezas quanto à capacidade de as mensalidades cobrirem as despesas, inibindo ainda investimentos das operadoras de planos em ofertar determinados produtos”, diz.