Representantes de hospitais, planos de saúde e escolas particulares se dizem prejudicados pela criação de um imposto único sobre bens e serviços e pressionam deputados e senadores a alterarem as propostas de reforma tributária que tramitam no Congresso.

Quase 40 emendas, mais de 10% das 350 apresentadas aos projetos da Câmara (PEC 45) e do Senado (PEC 110), se referem a esses setores, segundo levantamento feito pela equipe escritório Bichara Advogados a pedido da Folha.

Para os gestores dessas áreas, as propostas de unificação de tributos da Câmara e do Senado elevam a carga de impostos dessas empresas e levarão ao aumento nos preços de serviços como mensalidades escolares e planos de saúde, de até 20%, que seria o percentual estimado de aumento da carga tributária desses serviços.

Entre as emendas apresentadas por parlamentares, sugeridas pelos dois setores, está a adoção de uma alíquota menor para as áreas educação e saúde no IBS (Imposto sobre Bens e Serviços, uma espécie de IVA, que surgirá a partir da fusão de cinco tributos que recaem sobre o consumo). Outra emenda prevê a compensação por meio da desoneração total da folha de pagamento desses setores.

Como as propostas de reforma preveem manter a carga tributária total no nível atual, a redução de alíquota para um setor terá de ser compensada por um imposto maior para os demais.

“Podemos trabalhar com essas duas alternativas. O setor de serviços não tem como se desonerar, como a indústria tem. O nosso grande custo é folha de pagamento”, afirma Breno Monteiro, presidente da CNSaude (Confederação Nacional de Saúde).

Monteiro diz que o setor paga hoje, em média, cerca de 9% considerando os tributos tratados nas propostas do Congresso. Por isso, pede que uma alíquota 60% menor do IBS. Se o tributo for de 25%, com estimado pelos autores da proposta, o setor pagaria 10%.

Na Câmara, há várias emendas nesse sentido, que visam modificar o texto na comissão especial que trata do assunto. No Senado, o relator do texto, que está na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Casa, já atendeu à demanda e propôs uma alíquota diferenciada para as duas áreas.

O argumento desses setores é que a alíquota nominal será de 25% para todas as empresas, mas a alíquota efetiva será menor para quem puder gerar mais créditos tributários, o que beneficiaria, principalmente, a indústria.

Isso porque o novo sistema tributário prevê que o imposto pago sobre insumos seja devolvido ao contribuinte, que será tributado apenas sobre o valor que agregar ao produto. No caso dos serviços, os créditos podem ficar restritos, por exemplo, a despesas com energia elétrica.

“É pouco valor para se creditar. Estamos propondo a desoneração total do setor, pedimos isenção ou uma tabela diferente. Tanto no Senado como na Câmara nossas emendas são nesse sentido”, afirma Ademar Batista Pereira, presidente da Fenep (Federação Nacional das Escolas Particulares).

Amábile Pacios, representante do Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular, diz que a entidade também defende a isenção ou uma emenda já apresentada por parlamentares para reduzir em 70% da alíquota do tributo para o setor educacional, que hoje é tributo entre 5% e 8%, quando se considera dos tributos alvo da reforma.

“Nosso mercado já está saturado. Não tem como repassar essa diferença de imposto. Nem compensamos nem os que nos contratam podem compensar”, diz Amábile.

“Teria de aumentar em 20% a mensalidade”, diz Ademar Pereira, presidente da Fenep.

Nas escolas particulares, a mudança atingiria 20% das instituições, tributadas com PIS/Cofins e ISS. As outras 80% estão no Simples, sistema tributário que continuará opcional, ou são filantrópicas.

Pereira afirma, no entanto, que vê o risco de extinção do Simples ou de revisão da legislação sobre filantrópicas.

Os dois setores também argumentam que a prestação de serviços particulares de saúde e educação contribuem para reduzir a demanda por serviços públicos e os gastos do governo nas duas áreas.

Um dos autores da PEC da Câmara, o economista Bernard Appy, do CCiF (Centro de Cidadania Fiscal), afirma que, do ponto de vista distributivo, faz sentido tributar saúde e educação privado com a mesma alíquota dos demais setores, pois são serviços mais utilizados, proporcionalmente, por famílias mais ricas do que pelas mais pobres.

A pesquisa de orçamento familiar do IBGE divulgada recentemente mostra que, para os mais pobres, planos de saúde representam 0,4% das despesas. Educação, 1,9%. Entre os mais ricos, as duas despesas representam, respectivamente, 2,9% e 5,1% dos gastos.

“Do ponto de vista distributivo, se justifica. Mas, ao mesmo tempo, o sistema privado está absorvendo parte da demanda por saúde e educação pública”, afirma Appy. “É um tema politicamente sensível, mas existe mais de uma forma de tratar essa questão.”

Segundo Appy, países que adotaram nos últimos 30 anos o modelo de IVA (Imposto sobre Valor Agregado) previsto na PEC 45 utilizaram o sistema de alíquota única, mas que, de forma geral, é comum haver tratamento diferenciado para as áreas de saúde e educação.

O advogado Pedro Siqueira Neto, da área tributária do escritório Bichara Advogados, afirma que as duas propostas de reforma preveem um tributo diferenciado para produtos cujo consumo se quer desestimular, como cigarros e bebidas, mas não para atividades que se quer incentivar.

“Nas não tem uma válvula de escape para externalidades positivas, como saúde e educação, que são dois setores em que, se você se vale da iniciativa privada, você está tirando uma obrigação do setor público”, afirma.