​Os altos custos da judicialização da saúde nas redes pública e privada só diminuirão quando houver normas claras, um entendimento uniforme da Justiça sobre o tema e informação adequada para pacientes, juízes e agentes de saúde, de acordo com especialistas no assunto.

A judicialização foi tema de debate durante o 6º fórum A Saúde do Brasil, realizado na segunda-feira (27), no auditório do MIS (Museu da Imagem e do Som de São Paulo).

Após quase três anos de espera, o Supremo Tribunal Federal liberou, no dia 22 de maio, o fornecimento pelo poder público de medicamentos sem registro, mas apenas em situações excepcionais.

Há regras para que isso aconteça: o medicamento não pode ser experimental, tem de haver pedido de registro no Brasil e demora da Anvisa para analisá-lo, é necessário que ele tenha sido registrado em outro país e não pode existir um remédio que o substitua no Brasil.

Para Henrique Ávila, conselheiro do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), a decisão deve ajudar a frear a judicialização no país. Ele apontou, no entanto, ser essencial que o sistema judiciário passe a atuar em consonância com os novos precedentes para que as normas de fato funcionem.

“Se os juízes não seguirem a jurisprudência, a Justiça se tornará uma loteria, e os advogados vão toda vez tentar tirar a sorte grande”, afirmou.

Ávila destacou os altos custos e a complexidade do sistema judiciário como principais motivos para buscar reduzir a judicialização. Em 2018, a União gastou cerca de R$ 1,4 bilhão com medicamentos e tratamentos por determinação da Justiça, segundo o Ministério da Saúde.

De acordo com Bernardete Weber, superintendente de responsabilidade social do Hospital do Coração, a decisão do STF deve frear liberalidades e reduzir os pedidos de medicamentos, desde que as decisões judiciais sejam embasadas em pareceres técnicos.

“O sistema judiciário andou sozinho por muito tempo, o que gerou um ônus para os cofres públicos e para a saúde suplementar”, declarou.

A demanda por remédios, porém, não é a única causa de judicialização no Brasil.

Uma análise dos pedidos feitos em diferentes regiões permite ver lacunas nos serviços de saúde, que podem ser atacadas para reduzir a ocorrência desses casos, de acordo com Bernardete. “No Sul e no Sudeste, a judicialização é por remédios. Significa que já houve a consulta. Nas outras regiões, a procura é por exames e tratamentos, o que mostra um vazio assistencial.”

A superintendente ressaltou a importância de capacitar agentes de saúde para lidar com as demandas nos municípios, muitas vezes sobrecarregados com os pedidos. Para ela, é necessário que o poder público forneça especialistas que acompanhem a utilização de remédios e tratamentos, garantindo que seu uso seja adequado e não haja fraudes em pedidos judiciais.

Durante a palestra de abertura, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, elogiou a decisão do STF e afirmou que a judicialização é “plena” no país. “É como se tivéssemos ordenadores de despesas em todo o território nacional sem o devido monitoramento técnico.”

Uma das soluções apontadas por Mandetta é a incorporação de medicamentos com compartilhamento de risco, quando um remédio é adotado pelo sistema de saúde mesmo que os estudos não sejam  conclusivos. Se ele não tiver efeito, a farmacêutica deve devolver ao governo o valor pago.

O presidente da Anab (Associação Nacional das Administradoras de Benefícios), Alessandro Acayaba, citou dados de pesquisa encomendada pela associação à revista Consultor Jurídico, na qual foram identificadas as causas de conflitos judiciários na saúde suplementar.

Os quatro principais são inadimplência, cancelamento de contratos por parte das operadoras, negativa de cobertura e reajuste das mensalidades.

Para Acayaba, a solução das questões deve passar por um maior suporte técnico aos magistrados e informações adequadas ao consumidor.

“Ninguém está equivocado ao buscar seus direitos. Acredito que o brasileiro seja um consumidor de boa fé, mas ele pode não estar bem informado sobre aquilo que contratou”, concluiu.