A  nova metodologia de reajuste de planos de saúde individuais ou familiares, que seria aplicada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), pela segunda vez este ano, não fosse a suspensão por conta da pandemia, pode não ter o efeito esperado de reduzir os percentuais de aumentos anuais a partir do repasse dos ganhos de eficiência das operadoras e a redução da assimetria de informações entre empresas e consumidores.

É o que conclui nota técnica publicada, nesta sexta-feira, pelo Instituto de Pesquisa e Economia Aplicada (Ipea).

Segundo o estudo, a agência não utilizou a melhor variável para medir o índice de eficiência das operadoras. Ou seja, a capacidade das empresas de oferecerem o serviço de assistência à saúde com qualidade,  menor custo e sem desperdício.

Na avaliação dos pesquisadores Eduardo Fiúza , Alexandre Marinho e Carlos Octávio Ocké-Reis, da maneira como foi desenhada, a metologia não cria os incentivos corretos para que as empresas que têm um maior nível de eficiência em suas operações continuem melhorando, pelo contrário.

Segundo o documento, a ANS, em certo sentido, deturpou o conceito de eficiência a ser aplicado nos planos individuais ao optar por calculá-lo a partir dos custos dos contratos coletivos. A regra, destaca o texto, baseia-se numa comparação de preços e não de desempenho.

Além disso, os pesquisadores lembram que os planos de saúde coletivos – que representam 80% do mercado e servem como parâmetro para o reajuste dos planos individuais – não têm aumento regulado pela ANS.

Do jeito que está desenhado, para parte das empresas, há um incentivo a ineficiência. Seria preciso calcular o fator de eficiência pelas empresas de melhor desempenho ou por grupo de companhias. Na verdade para tornar o setor mais eficiente seria preciso olhar toda a cadeia – ressalta Fiúza.

Para Ocké-Reis, os custos do setor são uma questão de Estado.  Ele reforça que seria necessário olhar para os valores praticados por prestadores de serviços, como hospitais e clínicas:

– Isso não necessariamente deveria ser visto pela ANS, mas parametrizado pelo Ministério da Saúde, de forma que a agência tivesse informações de custos e pudesse acompanhar essa evolução. A visão da cadeia ajudaria a estabelecer melhor parâmetros de eficiência.

Na avaliação de Ocké-Reis, para ver o efeito da aplicação do modelo seria necessário fazer um exercício a partir dos dados dos últimos cinco anos:

– Na econometria é assim que construímos cenários. Seria preciso calibrar melhor o fator de eficiência de forma a não prejudicar as empresas de menor estrutura por um lado, mas por outro garantir que os ganhos de eficiência sejam de fato repassados por preços o que poderia reduzir os índices de reajuste – diz o economista.

A ANS, por sua vez, lembra que, em 2019,  primeiro ano de aplicação da metodologia, o Índice de Reajuste dos Planos Individuais (IRPI) foi reduzido de 8,13% para 7,35% “em razão exclusivamente da adoção do Fator de Ganhos de Eficiência (FGE)  em sua fórmula do reajuste”.

Ainda segundo a reguladora, na nova metodologia, definida em dezembro de 2018, o FGE é calculado a partir de um parâmetro da Variações de Despesas Assistenciais (VDA) das operadoras com o objetivo de incentivá-las a apresentar ganhos de eficiência na gestão das despesas assistenciais, o que os pesquisadores consideram que não é a alternativa mais adequada para medir eficiência do setor.

A agência pondera, no entanto,  que o FGE estabelece como parâmetro de eficiência uma medida de afastamento em relação à tendência central da variação das despesas assistenciais. Segundo a ANS, quanto maior a VDA das operadoras acima da tendência central do setor maior é o FGE.

A ANS explica que a VDA é uma média ponderada, e portanto o FGE limita a influência das variações mais afastadas do comportamento médio do setor no resultado do índice de reajuste.  A reguladora destaca ainda que até a definição dessa metodologia, houve amplo debate com a sociedade, e que foram analisadas alternativas, inclusive citadas pelos autores na nota técnica.

A ANS explica que diante “da complexidade e da falta de consenso na definição da função de produção de uma operadora de plano de saúde suscitariam a definição de outra alternativa para o FGE”.

E ressalta que a resolução que regulamentou a nova metodologia (RN 441/18), prevê uma revisão metodológica quadrienal. que deverá ocorrer entre 2021 e 2022, quando novas alternativas poderão ser avaliadas.

A ANS diz ainda “que todos os dados utilizados na atual metodologia são públicos, sendo possível reproduzi-la ou elaborar estudos que apresentem novas soluções para o FGE com as informações disponibilizadas anualmente pela ANS em seu site ou no Portal Brasileiro de Dados Abertos.”