A adoção de um novo cálculo para o reajuste anual dos planos de saúde individuais e familiares abriu um racha na diretoria da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Diante do impasse, decidiu-se que o novo modelo de cálculo não seria usado para o reajuste deste ano, a ser referendado pelo colegiado da ANS no dia 27. A tendência é que o índice de reajuste de 2018 fique próximo dos 13,55% aprovados no ano passado, segundo fontes que acompanham o assunto.

A nova proposta resultaria em uma redução de cerca de dois pontos percentuais em relação ao modelo atual, apurou o Valor. Mas ela recebeu duras críticas de dois diretores da ANS e não foi aprovada. Segundo esses diretores, há risco de o novo modelo reduzir ainda mais a oferta de planos para a pessoa física no mercado.

Apesar das discussões sobre a nova metodologia terem começado em 2010, a questão não vem avançando de forma linear na ANS. A matéria é de competência da diretoria de normas e habilitação de produtos, que é comandada por Karla Santa Cruz Coelho desde julho de 2016.

Em reunião de 16 de março, ela apresentou uma proposta de cálculo que considera a variação de três fatores: custo médico-hospitalar no período, faixa etária dos contratantes e um índice de produtividade. Atualmente, a conta é baseada em uma média dos reajustes dos planos coletivos, negociados livremente entre as operadoras e as empresas, sem nenhuma interferência da ANS.

A metodologia nova foi discutida em um grupo de trabalho criado em agosto do ano passado pelo presidente interino da agência, Leandro Fonseca. Os diretores Simone Freire (de fiscalização) e Rodrigo Aguiar (de desenvolvimento Setorial) disseram em seus votos que o grupo teria sido coordenado pessoalmente por Fonseca, sugerindo que ele seria o verdadeiro autor da proposta.

Para os dois diretores, faltou transparência na elaboração da metodologia, que teria sido feita às pressas, em sigilo e sem as devidas análises de impacto. Não deveria haver “documento reservado para os membros da diretoria colegiada dessa instituição porque, justamente, somos nós que respondemos pela gestão da ANS”, reclamou Simone Freire. De acordo com ela, o assunto estava parado desde 2015 e foi retomado com celeridade. A proposta teria sido elaborada e apresentada em cerca de 100 dias. “Há que se considerar o conflito entre o tempo necessário para realização da análise de impacto regulatório e o desejo de agilidade na regulamentação”, afirmou a diretora.

Aguiar também disse que Fonseca coordenou o grupo de trabalho, em conjunto com sua assessora especial, e que a proposta final não contemplou sugestões dos demais participantes.

O Valor apurou que a proposta apresentada resultaria em uma redução de cerca de dois pontos percentuais quando comparada ao modelo de reajuste atual. Aparentemente positiva aos usuários, a redução, na opinião de Simone Freire, poderia encolher a oferta de planos individuais com consequente subida dos preços.

“Essa regulação pode criar barreiras à comercialização, impactar concorrência, o investimento e a eficiência econômica. Num cenário como esse, é imprescindível a apresentação de informações e dados sobre possíveis efeitos do ato. Devem ser explicitados os custos e seus efeitos para os diferentes grupos afetados”, diz Simone Freire em seu voto.

No comando da ANS desde maio do ano passado, Leandro Fonseca nega que tenha coordenado a elaboração da proposta de reajuste e diz que apenas contribuiu para as discussões, ao sugerir a criação de um grupo específico para o tema. “O assunto foi conduzido pela diretora da área responsável. Não houve nenhuma competência sendo usurpada”, garantiu ele.

Segundo o presidente, o grande objetivo da mudança da metodologia é dar maior transparência e previsibilidade para os reajustes dos planos individuais. Fonseca também afirmou que ainda não é possível saber se o novo cálculo acarretaria em aumento ou queda dos percentuais de reajuste anual dos planos.

Oficialmente responsável pela definição da nova metodologia de reajuste, Karla Coelho garante que não terceirizou seu trabalho, como sugerem os votos de dois de seus colegas. Segundo ela, as discussões foram retomadas no ano passado sob seu comando. “A proposta ora apresentada é, portanto, fruto das discussões internas e das contribuições do comitê de regulação dos produtos, que contou com a participação de representantes do setor de saúde suplementar, de entidades representativas das operadoras de planos de saúde, de prestadores de serviços de saúde e órgãos de defesa do consumidor”, disse.