Tratando-se de questões relativas à saúde deve prevalecer a indicação médica. Com esse entendimento, a 7ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou um plano de saúde a pagar o tratamento de uma beneficiária diagnosticada com uma doença rara.

Além disso, o plano de saúde foi condenado por má-fé por afirmar indevidamente que o registro do medicamento havia sido cancelado pela Anvisa. O valor da multa por má-fé foi fixado em R$ 6,5 mil — 10% do valor da causa.

“O medicamento foi nacionalizado e sua comercialização autorizada em conformidade com a informação obtida no site da referida agência. Por sua vez, não há prova do cancelamento do alegado registro”, diz a decisão, lembrando que para que seja constatada a má-fé por alterar a verdade dos fatos não é necessário dolo, basta a culpa ou o erro inescusável.

No caso, a mulher foi diagnosticada com uma rara doença chamada Síndrome Hemolítico Urêmica (SHU). Os médicos responsáveis pelo tratamento, depois de tentarem uma série de medidas para frear o avanço da doença, prescreveram o medicamento Soliris (Eculizumabe), considerado a primeira linha no tratamento desta doença.

Administrativamente, o plano de saúde se recusou a custear o medicamento, o qual foi solicitado em caráter emergencial dado o risco de morte da beneficiária, e justificou sua posição alegando que o remédio não constava nas listas da Agência Nacional de Saúde para o tratamento da doença.

Foi então que a mulher ingressou com ação pendido que a operadora fosse obrigada a custear o tratamento. O advogado que representou a consumidora no processo, explica que é pacífica a jurisprudência no sentido de que, havendo expressa indicação médica, não pode prevalecer a negativa de cobertura do procedimento.

Ao julgar o pedido, a 7ª Câmara de Direito Privado reconheceu que, havendo indicação médica, o plano deve custear o tratamento, sendo abusiva a negativa sob o argumento do medicamento prescrito não estar previsto no rol de procedimentos da ANS.

“A resistência em fornecer o tratamento é abusiva, porque o contrato firmado entre as partes prevê o tratamento da enfermidade da autora, de modo que a ré não poderia se recusar a fornecer o tratamento, pois viola a regra do § 1º do inciso I do artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor”, afirmou o relator, desembargador Luís Mário Galbetti.

O relator lembrou que a questão já está pacificada no TJ-SP, que já editou três súmulas sobre o tema: 95, 96 e 102. “Ademais, já se decidiu que cabe ao médico especialista eleger o tratamento mais conveniente à cura do paciente e não ao plano”, concluiu, citando precedentes.

Além disso, determinou a condenação do plano de saúde por litigância de má-fé por alterar a verdade dos fatos, por alegar que o registro do remédio havia sido cancelado.

Para o advogado Tiago Gonçalves, esse tópico da condenação é mais importante do que pode parecer, pois mostra que as seguradoras e operadoras de planos de saúde devem tomar cuidado com defesas padronizadas, que repetem os mesmos argumentos nos mais diversos processos, não se preocupando com a adequação destes com o caso específico.

“Cansei de me deparar com glosas absolutamente divorciadas da realidade específica do segurado ou beneficiário. Por exemplo, em duas ações que discutiam a obrigatoriedade da operadora em custear o cirurgia metabólica para o tratamento da diabete melittus, tive que me deparar com negativa — e defesa em juízo — alegando que o consumidor não seria obeso, o que sequer era discutido nos autos”, conta.