A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) está reformulando seu processo de fiscalização, visando a racionalização dos procedimentos, com vistas a conferir maior celeridade e eficiência na aplicação das normas do setor de planos de saúde, em especial àquelas que afetam diretamente o beneficiário, e também para a promoção de maior segurança jurídica ao universo da saúde suplementar.

Diretor-adjunto de Fiscalização, Rodrigo Aguiar informa que, desde 2014, a agência vem promovendo uma série de mudanças em seus processos internos e na legislação do setor com a finalidade de aprimorar o trabalho desenvolvido e obter melhores resultados.

— Ainda que já tenham sido implementadas muitas mudanças em procedimentos internos que acarretaram na redução do tempo de tramitação de processos, no passivo de processos em estoque e no incremento da arrecadação de multas aplicadas nos últimos anos, concluiu-se que eram necessárias alterações na essência do processo fiscalizatório.

A projeção da diretoria de fiscalização é que o novo modelo fiscalizatório seja aprovado até o final do ano e que entre em vigor em julho de 2018, após capacitação dos servidores da ANS e do ente regulado.

— É muito importante que o consumidor contribua a respeito de temas que o afetam diretamente no dia a dia. Cerca de 25% da população brasileira tem plano de saúde e, segundo pesquisas já realizadas, trata-se de um sonho de consumo para a maioria dos brasileiros. Durante sete dias, todos os documentos relativos à proposta estarão disponíveis para consulta e após esse prazo será disponibilizado o formulário para envio de contribuições no site da ANS — informa Aguiar.

Segundo o diretor, o processo de construção dessa proposta foi feito de forma participativa, por meio de discussões com servidores da ANS e de representantes de órgãos como o Ministério Público Estadual do Rio de Janeiro, Defensoria Pública, das operadoras de planos de saúde, como FenaSaúde e Abramge, e entidades médicas. O consumidor foi representado pelo MP e pela Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon). Em setembro de 2016, tiveram início as discussões internas e, a partir de janeiro deste ano, foram realizadas quatro reuniões do Grupo de Trabalho criado para tratar do tema.

Fenasaúde: modelo atual penalisa e onera empresas

Participante do grupo de trabalho, Solange Beatriz Palheiro Mendes, presidente da FenaSaúde, afirma que o modelo atual apresenta desajustes de dosimetria das penas e desproporcionalidade entre conduta e infração:

— Com este modelo, a agência está apenando e onerando as empresas e não está alcançando o objetivo de induzir práticas melhores e de levar maior contribuição para o beneficiário. Há uma desproporcionalidade enorme na aplicação de valores de multas. Por exemplo, o atraso no agendamento de uma consulta pode penalizar a operadora com uma multa de R$ 80 mil. Isso acaba prejudicando também o consumidor. É importante que haja adequação dessa legislação, considerando algumas premissas e exemplos de outros órgãos reguladores, como o próprio Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), onde a multa é revertida para o Fundo de Defesa de Direitos Difusos (FDD) e os valores são utilizados em favor da coletividade, aos danos causados ao meio ambiente e ao consumidor, entre outras ações.

Solange acrescenta que a FenaSaúde, entidade que representa empresas do setor de saúde suplementar, apresentou o contexto de custos crescentes e queda acentuada do número de beneficiários, alertando que o modelo atual esta desajustado, com punição desproporcional, que incentiva o conflito e não estimula mudança de comportamento das operadoras. A revisão desse modelo, ressalta, deve fazer com que as próprias empresas busquem a mediação com o consumidor.

O novo modelo que está sendo proposto resultará em uma norma extensa, que agrega a Resolução Normativa nº 388/2015, que trata dos procedimentos das ações fiscalizatórias, à Resolução Normativa nº 124/2006, que trata das penalidades. Com isso, a agência contará com um instrumento único, um código de infrações da saúde suplementar.

 Em sua proposta, a ANS atendeu ao pedido dos órgãos de defesa do consumidor para que a Agência continuasse tratando as demandas individualmente, e não coletivamente. Para Christiane de Amorim Cavassa Freire, do Ministério Público do Rio de Janeiro, a ANS apresenta elevado índice de resolutividade das NIPs porque as trata individualmente, e o tratamento individual principalmente nos casos de urgência e emergência é fundamental. Segundo Christiane, o MP, que possui termo de cooperação firmado com a ANS, tem participado dos debates, apresentando contribuições:

— A busca da proporcionalidade das sanções é bem-vinda, bem como o aperfeiçoamento do procedimento fiscalizatório, desde que não implique em retrocessos para a proteção dos consumidores. Participaremos também da consulta pública.

Coordenadora do Núcleo de Defesa do Consumidor da Defensoria do Rio, Patrícia Cardoso, diz que a expectativa da Defensoria Pública é que o novo modelo possa dar mais subsídios para ANS poder fiscalizar de forma mais efetiva a prestação dos serviços por parte das operadoras.

— Entendemos que a iniciativa da agência de atualizar o tema criando um instrumento único de fiscalização facilitará imensamente o trabalho e proporcionará resultados de maior impacto no cumprimento das normas por parte das empresas. Mecanismos fiscalizatórios e punitivos atualizados podem gerar uma considerável melhora no atendimento dos consumidores.

Ana Carolina Navarrete, pesquisadora em saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a consolidação das regras de fiscalização e aplicação de penalidades em uma só normativa pode dar mais praticidade, mas é uma alteração incremental, não transformadora:

— O ponto crítico da fiscalização promovida pela ANS é o modo passivo do monitoramento, ou seja, envolve somente casos de consumidores que procuraram a agência reguladora. Nesse caso, a recomendação da Defensoria e do Ministério Público para manutenção da solução individual dos casos é muito importante para evitar queda na resolutividade do sistema de NIPs. Coletivizar, nessas situações, pode acarretar em tolerância de violações regulatórias que não ocorram em bloco.

De acordo com Ana Carollina, o Idec está analisando a Análise de Impacto Regulatório e as sugestões de modificação das multas:

— De todo modo, entendemos que ainda há espaço para a Agência articular uma fiscalização ativa, que vá a campo checar as informações relatadas, bem como leve em consideração as demandas do Judiciário e as reclamações recebidas pelos órgãos de defesa do consumidor. Nesse último caso, porque sabemos que as agências reguladoras não são quem o consumidor procura primeiro.

Melhor qualidade de dados para reduzir falhas do mercado

Solange conta que, nas reuniões do grupo de trabalho, a FenaSaúde defendeu uma regulação responsiva, ou seja, infração menos grave deve ter chance de adequação. Infração mais grave, penas mais severas. Dessa maneira, o novo modelo fiscalizatório deve promover o equilíbrio entre obrigações de adequação, incentivos para aperfeiçoamento de condutas e aplicação de penalidades em casos mais graves. A Federação também defendeu a proporcionalidade entre o problema causado e a multa aplicada e a proporcionalidade entre a multa aplicada e o segmento assistencial – médico ou odontológico, o que não acontece no modelo atual.

— Volto a afirmar que para a FenaSaúde é necessário evoluir no conceito de dosimetria das penas, considerando, a gravidade da infração, perigo de lesão e reincidência, entre outros fatores — ressalta Solange.

 Segundo o diretor-adjunto da ANS, o processo de construção dessa proposta foi feito de forma participativa, por meio de discussões com servidores da agência reguladora e de representantes de órgãos como o Ministério Público Estadual do Rio de Janeiro, Defensoria Pública, das operadoras de planos de saúde, como FenaSaúde e Abramge, e entidades médicas. O consumidor foi representado pelo MP e pela Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon). Em setembro de 2016, tiveram início as discussões internas e, a partir de janeiro deste ano, foram realizadas quatro reuniões do Grupo de Trabalho criado para tratar do tema.

O diretor da ANS, por sua vez, diz que a expectativa da diretoria de Fiscalização é que o novo modelo incremente a qualidade dos dados com que a ANS estabelece as suas políticas regulatórias, reduzindo as falhas de mercado e eliminando os entraves gerados pelas operadoras que venham a dificultar o atendimento ao beneficiário.

— Quando os processos são céleres e eficazes, as regras são mais claras e os procedimentos mais bem definidos, os resultados beneficiam a todos os integrantes do setor. O consumidor pode contar com respostas mais rápidas às suas demandas e maior eficiência do sistema como um todo — conclui Aguiar.