A reforma tributária proposta pelo governo federal elevará a cobrança de impostos de hospitais privados, clínicas de diagnósticos e planos de saúde, segundo estudos produzidos pelo setor. Esse aumento poderá resultar em repasse sobre as mensalidades dos convênios e preços cobrados de pacientes que utilizam os serviços de saúde da rede particular.

O estudo, encomendado pela CNSaúde (Confederação Nacional de Saúde) à consultoria LCA, calculou o impacto do projeto de lei 3887/20 sobre o setor. A proposta substitui o PIS/Pasep e Cofins por outro tributo, a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), com consequências diferentes para hospitais e laboratórios, de um lado, e planos médicos, de outro.

Planos de saúde

“A carga tributária dos planos de saúde aumentaria 131% com a proposta”, diz o estudo. A nova alíquota de 5,82% é maior que à anterior (4,65%) e seria cobrada em cascata (aplicada sobre a nota fiscal em todas as etapas da cadeia de operações), elevando a carga tributária das operadoras dos atuais 4,23% para 9,8%.

Segundo o estudo, essa elevação na alíquota provocaria um impacto nos custos dos planos de saúde que, se repassado, representaria uma alta de 5,2% no valor cobrado do consumidor.

O setor de saúde completar, porém, diz que ainda não é possível medir as consequências da reforma nem dizer se haverá alta para o consumidor (leia abaixo).

O estudo da LCA dá o seguinte exemplo caso esse custo fosse repassado ao consumidor: se um plano familiar custa hoje R$ 2.087, R$ 87 são tributos. Com a mudança, esse valor passaria a R$ 2.196, repasse de R$ 109.

O aumento trará uma redução de demanda por serviços de saúde da ordem de R$ 4,6 bilhões, o que equivale a perda potencial de até 500 mil beneficiários de planos de saúde, que passarão a depender do SUS (Sistema Único de Saúde).”
Estudo Reforma Tributária e Impactos ao Consumidor de Saúde Privada

Superintendente do IESS (Instituto de Estudos de Saúde Suplementar), José Cechin admite que o aumento dos custos “ao longo da cadeia” pode resultar em repasses aos pacientes, resultando em perda de clientes e consequente redução nas receitas de hospitais, laboratórios e operadoras.

O aumento promoverá fortes mudanças em todo o setor e rearranjo das empresas que contratam planos de saúde para seus colaboradores, seja deixando de ofertar o benefício, trocando fornecedores ou ainda fazendo downgrade [rebaixamento] dos produtos contratados. O setor público deverá absorver a demanda. Se por um lado o setor público ganha com receita de impostos, de outro, aumentam as despesas do SUS
José Cechin, superintendente da IESS

Hospitais e laboratórios

Já a alíquota para hospitais e laboratórios saltaria de 3,65% para 12%, elevando a carga tributária de 9,9% para 17,7%. Para esses casos, a cobrança não será em cascata, mas “o repasse do aumento provocaria reajuste de 7,4% para serviços hospitalares e laboratoriais”, diz a pesquisa.

No exemplo do estudo, o paciente arca com R$ 205 em tributos quando precisa pagar uma conta de R$ 2.205 por algum serviço hospitalar. “Com a reforma do governo, a família iria pagar R$ 2.368, aumento de R$ 162.”

Para o presidente do SindHosp (sindicato de clínicas e hospitais privados), Francisco Balestrin, o repasse pode ser ainda maior. “O aumento de carga provocará uma elevação dos preços ao consumidor entre 7% e 8% mais a CBS que virá embutida nas compras de medicamentos, materiais e insumos”, calcula.

Em estudo próprio, a Abramed (Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica) estimou aumento de 40% nos tributos, “R$ 3,6 bilhões ao ano para laboratórios e clínicas de imagem”. Para o paciente, “exames até 10% mais caros”.

“Cada laboratório e clínica de imagem terá liberdade para decidir como reorganizará suas contas”, diz Priscilla Franklim Martins, diretora-executiva da entidade. “Poderão ocorrer cortes na força de trabalho, aumento do preço de exames individuais e de alta complexidade, redução da oferta, incremento no custo geral de todos os procedimentos.”

O projeto do governo aguarda a formação de uma comissão especial na Câmara dos Deputados. Procurados, os ministérios da Saúde e da Economia não responderam até o fechamento da reportagem. Se enviados, os posicionamentos serão incluídos neste texto.

Em nota, a CNSaúde diz que apoia a reforma tributária e “não defende qualquer benefício ao setor de saúde, mas sim a manutenção da atual carga”.

“O aumento da carga, na contramão do que faz a maior parte dos países em relação à saúde, levará ao aumento dos preços de produtos e serviços médicos e também ao fechamento de empresas e empregos, sobrecarregando dessa forma o SUS”, escreve.

O que dizem os planos de saúde

Em notas, a FenaSaúde (Federação Nacional de Saúde Suplementar) e a Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde), que representam o setor, dizem defender a reforma tributária, mas rebatem o estudo.

“A FenaSaúde não corrobora as conclusões de estudos feitos até o momento, uma vez que ainda não é possível conhecer, na sua inteireza, os efeitos das várias propostas em tramitação no Congresso sobre a atividade e sobre a cadeia de produção da saúde.”

Já a Abramge diz que, “ao contrário de estudos apresentados na área de saúde, a reforma tem potencial para ampliar o volume de recursos disponíveis para investimento, desburocratizar e possibilitar que mais brasileiros tenham acesso a cobertura privada”.