“Caso desrespeitada a regulação incidente. De duas uma. Ou sobrecarregam-se os usuários com a consequente repasse dos custos ao preço final, impedindo o maior acesso da população. Ou inviabiliza-se a atividade econômica desenvolvida pelas operadoras e seguradora”.

Essas palavras do ministro relator Luis Felipe Salomão (EREsp. 1.886.929/SP e 1.889.704/SP) reforça a saúde como direito fundamental de segunda dimensão e entende que o rol ANS “é, em regra, taxativo”.

Por certo, a publicação do acórdão permitirá maior aprofundamento dos inúmeros motivos — jurídicos, econômicos e sociais — que sustentam a taxatividade do rol.

De todo modo, a análise da tese recém fixada exige, mesmo que dos mais experientes, cautela para entender todo o cenário, sem se deixar ofuscar pelo brilho de um rol taxativo sem exceção.

A discussão possivelmente se estenderá nos Tribunais Estaduais e, ainda, longos e acalorados debates serão vivenciados, mas uma premissa precisa ser consolidada: a regra não pode ser tornar uma exceção. Já que há clareza solar no fato de que o rol é taxativo, nos seguintes termos:

“1 – o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar é, em regra, taxativo;
2 – a operadora de plano ou seguro de saúde não é obrigada a arcar com tratamento não constante do Rol da ANS se existe, para a cura do paciente, outro procedimento eficaz, efetivo e seguro já incorporado ao Rol;
3 – é possível a contratação de cobertura ampliada ou a negociação de aditivo contratual para a cobertura de procedimento extra Rol;
4 – não havendo substituto terapêutico ou esgotados os procedimentos do Rol da ANS, pode haver, a título excepcional, a cobertura do tratamento indicado pelo médico ou odontólogo assistente, desde que:
1) não tenha sido indeferido expressamente, pela ANS, a incorporação do procedimento ao Rol da Saúde Suplementar;
2) haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências;
3) haja recomendações de órgãos técnicos de renome nacionais (como Conitec e Natjus) e estrangeiros; e
4) seja realizado, quando possível, o diálogo interinstitucional do magistrado com entes ou pessoas com expertise técnica na área da saúde, incluída a Comissão de Atualização do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar, sem deslocamento da competência do julgamento do feito para a Justiça Federal, ante a ilegitimidade passiva ad causam da ANS”.

Não há como negar que a tese manteve a possibilidade de decisões judiciais favoráveis aos usuários diante de casos excepcionais.

Além disso, há inúmeras iniciativas legislativas que visam estabelecem o rol exemplificativo (Senado Federal, Projetos de Lei nºs 1557/2022, 1570/2022, 1571/2022, 1575/2022, 1579/2022, 1585/2022, 1590/2022, 1592/2022 e 1594/2022; Câmara dos Deputados, Projetos de Lei nºs 1556/2022, 1563/2022, 1564/2022, 1567/2022, 1568/2022, 1573/2022, 1581/2022, 1584/2022, 1587/2022, 1589/2022, 1618/2022 e 1627/2022 etc.), toda essa discussão ainda poderá ser objeto de recurso “dos usuários” e na última segunda-feira (13/06/22) o Comitê Brasileiro de Organizações Representativas das Pessoas com Deficiência (CRPD) ajuizou no STF a ADI nº 7.183, com pedido de liminar, contra dispositivos de normas que tratam do rol de procedimentos e eventos em saúde, sob a relatoria do ministro Roberto Barroso (prevento em razão da ADIn 7.088).

De todo modo, juridicamente falando, não houve modulação de efeitos da decisão e todos os juízes e tribunais que deverão imediatamente observar o entendimento fixado pela 2ª Seção do STJ (artigos 926 e seguintes do CPC).

O rol taxativo deverá alicerçar a conduta combativa de todos os advogados (do autor ou réu) que atuam na Saúde Suplementar e defendem as regras juridicamente estabelecidas pelo Estado Brasileiro para esse setor.

Diante da facticidade que o direito necessita para se concretizar, o caso concreto ganha relevância e norteará o caminho à regra (rol taxativo) ou à exceção, cabendo ao magistrado fundamentar sua decisão para demonstrar que obedece ao Direito Democraticamente produzido (Constituição Federal, Leis Federais e Normas da Agência Nacional de Saúde Suplementar/ANS), trazido à luz pela decisão da 2ª Seção do STJ.

Nos processos que envolvem a saúde suplementar não há mais espaço para argumentações que transformem tratamentos médicos sem evidência científica em meios necessários à sobrevivência do indivíduo por simples elã do médico assistente.