A 4ª turma do STJ negou pedido de consumidora para obrigar plano de saúde a custear procedimento que não está previsto pela ANS. A decisão foi em julgamento ocorrido nesta terça-feira, 10, em caso de relatoria do ministro Luis Felipe Salomão.

A autora ajuizou ação por ter a operadora do plano de saúde se recusado a ofertar materiais para cirurgia prescrita pelo médico (cifoplastia) em decorrência de doença que ocasiona desgaste nas vértebras; a ré se dispôs a liberar apenas o procedimento denominado verteroplastia, que implica injeção de metilmetacrilato via percutânea no corpo vertebral para recuperar a sua altura originária.

O TJ/PR considerou que a cifoplastia não está no rol da ANS, tampouco tem efetividade e vantagens estabelecidas. Além disso, que a operadora liberou tratamento similar com eficácia comprovada, estando em seu exercício regular de direito.

Em recurso contra acórdão do TJ/PR, a autora alegou, entre outros, que o rol da ANS é apenas exemplificativo, e o contrato não faz nenhuma menção de exclusão do procedimento, devendo prevalecer no caso as previsões do CDC.

Prevalência da regra excepcional

O relator, ministro Luis Felipe Salomão, ressaltou no início do voto a dispersão da jurisprudência quanto à matéria – a 3ª turma compreende que o rol (mínimo) de procedimentos e eventos em saúde obrigatórios da ANS seria meramente exemplificativo.

Salomão consignou que o direito à saúde é direito humano fundamental, tanto que a CF/88 foi a primeira Carta Política nacional que formalmente assim declarou.

Com efeito, resguardado o núcleo essencial do direito fundamental, no tocante à saúde suplementar, são, sobretudo, a Lei n. 9.656/1998 e a Lei n. 9.961/2000 e os atos regulamentares infralegais da ANS e do Conselho de Saúde Suplementar, expressamente prestigiados por disposições legais infraconstitucionais que, representando inequivocamente forte intervenção estatal na relação contratual de direito privado (planos e seguros de saúde), conferem densidade normativa ao direito constitucional à saúde.”

Ao discorrer acerca da lei dos planos de saúde, o relator esclareceu que uma das principais inovações da lei foi a obrigatoriedade da obtenção de autorização de funcionamento das operadoras e o compulsório registro dos contratos na agência reguladora, seus respectivos conteúdos atuariais e cláusulas de cobertura.

O escopo do legislador foi regular a atividade de assistência à saúde suplementar, independentemente da natureza jurídica sob a qual se formaliza a entidade incumbida de prestar os respectivos serviços.”

Assentada a competência da ANS e a submissão dos planos e seguros de saúde à lei, S. Exa. consignou que o rol mínimo e obrigatório de procedimentos e eventos em saúde constitui relevante garantia do consumidor para assegurar direito à saúde, em preços acessíveis, contemplando a camada mais ampla e vulnerável da população.

Por outro lado, prosseguiu Salomão no extenso voto, o entendimento de que o rol é meramente exemplificativo, devendo a cobertura mínima, paradoxalmente, não ter limitações definidas, tem o condão de efetivamente padronizar todos planos de saúde.

Não parece correto afirmar abusiva exclusão do custeio dos meios e materiais necessários ao tratamento indicado pelo médico, diante dos seguintes dispositivos legais da lei de regência da saúde suplementar (Lei n. 9.656/1998) (…).

Para o relator, no confronto entre as regras específicas e as demais do ordenamento jurídico, como o CDC, prevalece a regra excepcional.

Sem descuidar do embate, no bojo da controvérsia, entre dois valores antagônicos – o equilíbrio da operação econômica versus o interesse do consumidor na preservação da sua saúde –, o ministro não descartou a  possibilidade de a operadora pactuar com o usuário para que ele cubra a diferença de custos entre os procedimentos do rol ou da cobertura contratual e o orientado pelo médico assistente.

No caso, concluiu, a ré está amparada pela excludente de responsabilidade civil do exercício regular de direito (art. 188, I, do CC). “É incontroverso, constante da própria causa de pedir, que a ré ofereceu prontamente o procedimento de verteroplastia, constante do rol da ANS”, disse, para também negar o pedido de indenização por dano moral.

Ademais, conforme consta da própria exordial e esclarecido por amici curiae, a operadora do plano de saúde recorrida ofereceu procedimento do rol da ANS inequivocamente adequado ao tratamento, sendo bem de ver, a título de oportuno registro, que o procedimento cifoplastia nem sequer consta na Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos – CBHPM.

A turma acompanhou, à unanimidade, o entendimento do relator Salomão.