ANS fez audiência pública para debater com o setor propostas que incluem, entre outros pontos, sinistralidade mínima de 75% e coparticipação e franquia de no máximo 30% da mensalidade
Em mais um capítulo para aprovação do pacote de medidas da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) que mudam a política de preços dos planos de saúde, operadoras se manifestaram contra as propostas da reguladora durante audiência pública nesta terça-feira. O projeto inclui itens como a criação de regras para o aumento dos contratos coletivos e limites para cobrança de coparticipação e franquia.
- Planos de saúde: Ferramenta do GLOBO mostra como escolher a melhor opção
- Imposto de Renda: Recibo médico só poderá ser emitido de forma eletrônica, entenda
Cesar Sergio Cardim Junior, superintendente de Regulação da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), que representa 12 grandes grupos de planos de saúde do país, disse que a tramitação do projeto da ANS acontece “em ritmo acelerado” e que os prazos de cada etapa do processo foram insuficientes para que as operadoras calculassem os impactos das propostas.
O executivo também destacou que faltam dados e estudos técnicos, por parte da ANS, sobre o impacto financeiro e operacional do projeto nas operadoras.
— O tempo é exíguo para que a gente trate de assuntos que são estruturantes, muito relevantes e de muito impacto para a saúde suplementar. Tivemos que realizar estudos técnicos para entender a abrangência das propostas — afirmou.
- Botox e harmonização facial: Fraudes contra operadoras de saúde chegam aos planos odontológicos
O combo de medidas foi proposto no início de outubro pela agência reguladora. Depois de passar por audiência pública, a pauta foi aberta para receber contribuições de operadoras, consumidores e instituições da sociedade civil. Em meados de dezembro, os diretores do órgão regulador aprovaram um relatório preliminar com o detalhamento das medidas.
Uma das propostas prevê que a chamada sinistralidade — a fatia da receita da operadora que é usada para custear a assistência médica dos usuários — tenha uma meta mínima de 75%. Para as operadoras, porém, o estabelecimento de um percentual mínimo de receita a ser destinada ao uso em si dos planos não deve acontecer.
— Ao fazer isso, a minuta nos faz entender que há uma desconsideração do perfil dos contratantes, tamanho dos contratos, regras de comissionamento, porte e perfil das operadoras, entre outros pontos — opinou Cardim Junior. — Isso pode atingir o equilíbrio dos contratos, cercear a liberdade das empresas, impactar o modelo de negócios e ocasionar na falta de interesse na oferta de produtos.
Reajuste dos coletivos
Outra proposta trazida pela ANS é a proibição do acúmulo de índices (financeiro e sinistralidade) para o cálculo do reajuste dos planos coletivos. Diferente dos individuais, os planos coletivos não têm um percentual máximo de aumento definido pela ANS, e a correção anual é negociada entre a operadora e a empresa contratante.
— Defendemos a aplicação dos dois índices porque cada um tem uma função específica e mede diferentes aspectos, e a impossibilidade de aplicação de um ou outro implica em desequilíbrio econômico-financeiro — defendeu o representante da FenaSaúde.
- Unimed Ferj fecha acordo com ANS para reequilibrar contas. O que muda para o usuário?
A Unimed do Brasil, que representa as 270 Unimeds, argumentou que 169 operadoras brasileiras têm despesas não-assistenciais acima de 25% de suas receitas.
— Ou seja, essas operadoras não conseguiriam sobreviver a essa sinistralidade meta proposta. O sistema de saúde suplementar não existe só nas capitais, mas também no interior, e é formado por empresas de pequeno, médio e grande porte. Esse pacote de mudanças de reajuste dos planos coletivos pode vir a destruir as pequenas e médias operadoras e sobrecarregar o SUS — afirmou o representante da empresa, Daniel Infante.
Coparticipação limitada
Outro ponto previsto pela ANS no pacote de medidas limita a 30% a cobrança de coparticipação por procedimento. O total de coparticipações também não poderia passar de 30% da mensalidade. Pelo projeto, coparticipação e franquia também ficariam proibidas numa lista de procedimentos, principalmente aqueles relacionados a terapias crônicas, oncologia, hemodiálise e alguns exames preventivos.
Atualmente, cerca de 60% do total de beneficiários de planos médico-hospitalares estão em contratos com coparticipação e franquia. No entanto, não há regras que limitam as cobranças pelas operadoras, seja por procedimento ou pelo total de cobranças ao mês.
Segundo Daniele Rodrigues Campos, gerente econômico-financeiro da ANS, há problema na cobrança de valores excessivamente altos e até em medicamentos e materiais ou procedimentos que não deveriam ter cobrança de coparticipação e franquia, como aqueles que não são da escolha do consumidor fazer ou não fazer.
— É importante que se diga que o instrumento de financiamento de plano de saúde é a mensalidade. Onerar o consumidor com coparticipação excessivamente alto pode se tornar financiamento do produto — disse.
Superintendente executivo da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), Marcos Novais argumentou que a proposta praticamente equipararia a cobrança dos planos com coparticipação e franquia aos contratos sem cobranças extras, o que, em sua opinião, pode elevar preços e reduzir o acesso dos beneficiários aos planos de saúde.
— Se a proposta for implementada, o modelo com coparticipação deixa de existir. E isso traz pra gente a questão do impacto no acesso. A própria análise da agência diz que um dos efeitos é o aumento de preço na entrada. Isso tem impacto na inflação e no próprio setor público, porque vai reduzir acesso e aumentar no SUS — afirmou.
- Planos de saúde e hospitais se unem para reduzir custos: entenda o novo modelo para o consumidor
Para o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), estipular um limite percentual para coparticipação e franquia dificulta a compreensão e o acesso a informação pelos usuários dos planos. O instituto sugeriu que a ANS considere, em vez de percentual, um valor fixo “em patamar módico ao consumidor”.
— A função central desses mecanismos não é o financiamento dos serviços, tampouco a sustentabilidade das carteiras e operadoras. Por isso, eles jamais podem impedir ou encarecer o uso do plano de saúde — observou a advogada Marina Paulleli, do programa de Saúde do Idec