O presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), Paulo Rebello, afirmou que a agência deve decidir ainda este semestre novas regras para a revisão técnica, mecanismo adotado em situações específicas para reajuste das mensalidades de planos. A ideia, de acordo com Rebello, é permitir que o instrumento possa ser usado de forma mais ampla, e não apenas em casos de desequilíbrio econômico-financeiro.

A proposta prevê uma série de condições para que a revisão seja pleiteada pela operadora. Uma das possibilidades seria permitir a revisão para contratos muito antigos.  No plano, que está em elaboração, haveria também necessidade de contrapartidas. “Uma delas seria a obrigação de a empresa voltar a oferecer no mercado planos individuais”, disse Rebello na noite de 22/2 durante Diálogos, evento do JOTA exclusivo para assinantes.

A próxima edição do Diálogos de Saúde será em 14 de março, com a presença da diretora da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Meiruze Freitas.

De acordo com o presidente da ANS, nesse formato, o pedido de revisão técnica seria submetido à agência, que analisaria as condições caso a caso antes da decisão. Tal mecanismo permitiria reajustes distintos, de acordo com as condições de cada operadora.

Há ainda um caminho a se percorrer antes de o tema ser votado pelos diretores da agência. Mas Rebello acredita que essa agenda pode ser cumprida nos próximos meses. “A agência precisa regular o mercado, não pode regular em casos excepcionais”, afirmou, logo depois do evento.

Rebello observa que a revisão foi feita no caso da Unimed Paulistana, uma situação pontual, em sua definição.

O presidente da ANS admite que a proposta deve provocar a resistência de associações ligadas à defesa do consumidor. Mas acredita que o debate é necessário.

A oferta de planos de saúde individual sofreu uma queda expressiva ao longo dos últimos anos. Depois da entrada em vigor da lei que regulamenta o setor, em 1998, empresas reduziram a oferta de planos novos no mercado.

A estratégia teve como objetivo justamente driblar a interferência direta da ANS na fixação dos preços das mensalidades. Um dos mecanismos usados para reduzir a oferta foi apresentar planos com preços muito mais altos do que os demais.

Idec critica eventual retomada de revisão técnica

Especialistas em defesa do consumidor manifestaram preocupação com a proposta em análise na ANS sobre revisão técnica. O último caso de revisão técnica ocorreu com a Unimed Paulistana em 2015, em meio a um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado com Ministério Público, ANS e Procon. A norma que regula as revisões técnicas, no entanto, teve a constitucionalidade questionada desde 2001 em ação civil pública do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). A ação aguarda julgamento no Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3).

O Idec obteve sentença favorável em primeira instância para anular a revisão técnica das operadoras Associação Auxiliadora Classes Laboriosas e Interclínicas. Nesse processo, o instituto argumentou que a norma viola o Código de Defesa do Consumidor (CDC).

“Como essa ação ainda está pendente de julgamento e foi suspenso o termo de compromisso respaldado pela norma, há um questionamento sobre a legalidade em jogo”, explicou ao JOTA a advogada Ana Carolina Navarrete, coordenadora do programa de saúde do IDEC.

“É uma completa descaracterização do contrato. Isso gera uma situação de insegurança para o consumidor. Revisão técnica é um instrumento muito complexo e polêmico”, acrescentou.

Entre advogados especializados em defesa de consumidores, a proposta de revisão técnica também provoca preocupação. “Se além do reajuste ainda houver revisão técnica, isso pode acarretar quase na inviabilidade do consumidor continuar no plano”, afirmou ao JOTA o advogado Rafael Robba, sócio do escritório Vilhena Silva.

Mesmo caso a revisão técnica venha acompanhada da obrigatoriedade de oferta de planos individuais, como cogita o presidente da ANS, o Idec avalia que essa medida seria inócua.

“Não tem garantias de que a obrigatoriedade de oferta de plano individual emplacaria, porque as operadoras controlam o preço de entrada. Podem inflar o preço, colocar um preço impraticável e as pessoas não vão contratar”, explicou Navarrete, do Idec.