O Supremo Tribunal Federal (STF) manteve a obrigação dos planos de saúde ressarcirem o Sistema Único de Saúde (SUS) toda vez que um paciente não for atendido pelo plano privado e precisar recorrer ao serviço público. O reembolso está previsto na lei que regula os planos de saúde, de 1998. A decisão do STF é definitiva, não cabe recurso. Os outros tribunais brasileiros ficam obrigados a seguir o mesmo entendimento ao julgar o assunto.

No ano passado, o repasse foi recorde, de R$ 458,81 milhões. Foram identificados 852 mil atendimentos de usuários de planos no SUS, o que representou 41% do que foi cobrado. Desde 2000, quando foi criada a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), responsável pela cobrança e repasse ao SUS, foram cobrados R$ 7,5 bilhões dos planos e transferido R$ 1,9 bilhão ao SUS, equivalente a 25,3% da dívida.

— A decisão reforçou o marco regulatório. Se o Supremo tivesse considerado o artigo inconstitucional, teria um impacto gigantesco nas operações da agência. Outro impacto positivo será a liberação de depósitos judiciais que as empresas faziam por saber que havia ação no Supremo contestando a cobrança. Estimativas do mercado, não oficiais, são de R$ 3 bilhões depositados no Judiciário — afirmou Rodrigo Aguiar, diretor de Desenvolvimento Setorial da ANS.

O STF também manteve o entendimento de que os contratos firmados antes da Lei dos Planos e Saúde, de 1998, não podem ser atingidos pelas novas regras. Outra norma que o tribunal confirmou foi a possibilidade de operadoras cobrarem mensalidade mais cara de usuários com mais de 60 anos. A exceção é para pacientes com essa idade, mas que já contribuem com o plano há pelo menos dez anos.

O plenário do STF também manteve a validade de uma lei de Mato Grosso do Sul que obriga as operadoras de planos de saúde a informar o paciente sobre o motivo de ter negado cobertura de assistência médica. A decisão vale apenas para esse caso, mas poderá ser levada em conta se forem questionadas leis semelhantes de outros estados.

Segundo Aguiar, as empresas contestam as cobranças, alegando que o cliente ainda está em período de carência, ou não fez o pagamento do mês, ou está fora da abrangência territorial do contrato do cliente.

A presidente da Federação Nacional de Saúde (Fenasaúde),Solange Mendes, diz que nada muda na operação das seguradoras, inclusive nos preços, pois as empresas já vêm cumprindo a lei.

— A decisão do Supremo não vai trazer qualquer modificação no que as seguradoras já vêm cumprindo. Elas cumprem rigorosamente a regulamentação da ANS que se dá com base na lei. Portanto, esses dispositivos que foi no sentido de validar esses dispostivos legais que as empresas já vem cumprindo.

A Confederação Nacional de Saúde (CNS), que representa os planos de saúde, questionou a regra do ressarcimento no STF. Segundo a entidade, a saúde é um direito de todos os cidadãos, de responsabilidade do poder público. Portanto, a opção de um paciente pela rede pública não deveria prejudicar o setor privado.

_ Se eu resolvo contratar segurança armada, estou impedido de chamar a polícia? A empresa vai ter que pagar a polícia? _ questionou no plenário o advogado da CNS, Marcelo Ribeiro.

Mas os nove ministros que participaram da sessão mantiveram a regra do reembolso. O relator da ação, ministro Marco Aurélio Mello, lembrou que os planos de saúde são obrigados a pagar pelo atendimento – seja na rede pública ou privada.

_ A norma impede o enriquecimento ilícito das empresas e perpetuação da lógica do lucro às custas do erário. Entendimento contrário significa que os planos de saúde recebem pagamento, mas serviços continuam a ser prestados pelo Estado, sem contrapartida _ disse o relator.

O ministro Alexandre de Moraes acrescentou que os pacientes só procuram a rede pública quando os planos falham em prestar o atendimento adequado. Portanto, caberia às operadoras arcarem com o custo.

_ Quantas vezes o plano de saúde demora para dar autorização para um procedimento? A ineficiência faz com que muitas vezes se procure o SUS. Não se pode falar em empobrecimento sem causa das seguradoras. O que ocorreria aqui, se não houvesse o ressarcimento, seria o enriquecimento ilícito _ argumentou Moraes.

Ana Carolina Navarrete, pesquisadora de saúde do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), entende que o ressarcimento também impele as empresas a cumprir o contrato:

_ Se a operadora de plano de saúde não presta o atendimento, e o cliente é obrigado a buscar o sistema público, isso significa enriquecimento ilícito no entendimento do Supremo. O ressarcimento também é um mecanismo para compelir as operadoras a cumprirem suas obrigações. Uma política de garantia, uma espécie de justiça dos dois sistemas, para que ninguém fique prejudicado.