A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) planeja flexibilizar a movimentação de ativos nas mãos das operadoras de planos de saúde. Pela regra atual, para fazer operações financeiras usando ativos garantidores – imóveis, ações, títulos ou valores mobiliários -, a empresa precisa pedir à ANS uma autorização a cada movimentação. A nova regra permitirá uma autorização anual, o que dará mais agilidade às operadoras pois, atualmente, o prazo para obter o sinal verde da ANS, para cada aplicação financeira, varia de 15 a 29 dias.

Segundo dados da agência, as operadoras têm R$ 20,3 bilhões em ativos garantidores. Estes funcionam como uma reserva. Servem para assegurar que a operadora terá dinheiro para pagar procedimentos realizados pelos usuários do plano de saúde como exames clínicos e cirurgias. Enquanto esses valores não são usados, ficam em contas vinculadas à ANS e podem ser usados em investimentos financeiros, gerando lucro aos planos de saúde.

A operadora, para aplicar esses recursos, precisa seguir critérios de liquidez, segurança e rentabilidade, determinados pela ANS. “A regulação econômica do setor procura induzir que a operadora faça uma gestão prudente desse recurso. Ela precisa constituir uma série de provisões, quais são as contas para pagar, e precisa ter ativos suficientes para cobrir essas provisões”, diz o diretor de normas e habilitação das operadoras da ANS, Leandro Fonseca.

Antes de bater o martelo sobre a autorização anual, a ANS marcou uma audiência pública para o dia 14 de fevereiro. Segundo Fonseca, a nova regulação não vai afetar o atendimento aos clientes e só poderá ser usada por empresas solventes, capazes de honrar seus compromissos.

A mudança na norma que permite agilizar a aplicação financeira dos ativos garantidores é um pedido antigo das operadoras, que têm perdido usuários com a recessão – o desemprego alto tem feito com que muita gente perca o plano de saúde, no ano passado, 1,5 milhão de pessoas ficaram sem plano de saúde.

Desde 2001, logo após ser criada no governo Fernando Henrique Cardoso, a ANS vem adotando medidas para regular a constituição de capital dos planos de saúde. Isso quer dizer que, de forma progressiva, a agência vinha criando exigências para que as operadoras de saúde fizessem reservas financeiras para assegurar o pagamento de seus compromissos.

Em 2007, quando a ANS passou a exigir a contabilização de provisão de risco e capital mínimo, também foi criada a exigência de ativos garantidores vinculados à agência. E esta passou a exigir uma autorização para cada aplicação a ser feita no mercado financeiro. Este é o ponto que deve mudar.

“Estamos trazendo mais eficiência para esse processo de trabalho, fazendo uma avaliação prévia da regularidade econômico-financeira dessa operadora. Se ela estiver regular, vai ter uma autorização prévia anual para que ela possa fazer uma gestão financeira mais ativa e buscar um resultado financeiro melhor”, diz Fonseca. Existe um teto para cada tipo de aplicação, e quanto mais arriscado é o investimento, menor é este limite.

Parte do resultado das operadoras é obtida no mercado financeiro, com, por exemplo, compra de títulos da dívida pública, ações na bolsa de valores, imóveis, fundos multimercados, entre outros investimentos. Segundo dados da ANS, até o terceiro trimestre de 2016, cerca de 90% do faturamento das operadoras vinha do pagamento de mensalidade dos clientes e aproximadamente 10%, de outras fontes, incluindo operações financeiras. As receitas de contraprestações, provenientes dos pagamentos feitos pelos usuários dos planos, somavam até setembro R$ 118,3 bilhões e as outras receitas operacionais, R$ 12,7 bilhões.

Fonseca assumiu a diretoria de normas da ANS em dezembro e quer implementar ao longo de 2017 outras mudanças para “reestruturar o setor pelo lado da oferta”. O objetivo é tornar as contas dos planos de saúde mais saudáveis, principalmente em relação às operadoras de menor porte. Cerca de 50% das operadoras atualmente tem menos de 15 mil clientes. “As pequenas operadoras estão mais expostas ao risco”, diz Fonseca”. “Se a base de beneficiários é maior, o risco de solvência é mais diluído”, observa.

Ao longo deste ano, Fonseca também pretende criar um comitê de solvência para analisar a situação das companhias. Uma solução possível para tornar o setor mais equilibrado é o incentivo de fusões e o compartilhamento de risco, como uma modalidade de cosseguro, quando mais de uma seguradora é responsável pelo cliente.

Economista de formação, Fonseca especializou-se em finanças corporativas e fez mestrado em regulação na London School of Economics and Political Science. Começou a trabalhar no setor público em 2004, passando pelos ministérios do Planejamento e da Fazenda. Foi cedido à ANS, onde ocupou vários cargos, há sete anos.

O setor de saúde suplementar possui 1.112 operadoras em atividade, sendo 800 operadoras de planos médico-hospitalares e 312 operadoras exclusivamente odontológicas. Mais de 83% das operadoras estão em situação regular, na avaliação da ANS.

O restante (ou 17% delas) estão na seguinte situação: 60 operadoras estão inseridas no Programa de Adequação Econômico-Financeira da agência, 56 estão em situação de direção fiscal da ANS (quando a agência coloca um fiscal trabalhando dentro da operadora) e outras 69 estão em processo de cancelamento de registro. Neste último caso, não há perspectiva de recuperação econômica da operadora, que é considerada insolvente.