Não são poucas as causas que versam sobre a negativa de prestação dos serviços pelos planos de saúde, seja pelas limitações anuais de atendimento expostas em contrato, seja pela ausência do tratamento indicado no rol da ANS.

Especialmente quanto à segunda hipótese, são diversos os relatos que indicam que o supracitado rol atualmente se encontra obsoleto, uma vez que existem novos tratamentos comprovadamente efetivos que lá não se encontram.

Como exemplo, o tratamento ABA (Applied Behavior Analysis) – Análise do comportamento aplicada, muito aplicado no tratamento dos portadores de TEA – Transtorno do Espectro Autista, não se encontra figurado no rol da ANS, sendo que é um tratamento conhecido mundialmente e de eficácia comprovada, senão o único. Vejamos.

Basicamente, o ABA trabalha no reforço dos comportamentos positivos. A academia nacional de ciências dos EUA, por exemplo, concluiu que o maior nº de estudos bem documentados se utilizou de métodos comportamentais.

Além disso, a Associação para a Ciência do Tratamento do Autismo dos Estados Unidos, afirma que a terapia ABA é o único tratamento que possui evidência científica suficiente para ser considerado eficaz.1

O tratamento supracitado é adequado e, repito, cientificamente comprovado. Por qual motivo não se encontra presente no Rol da ANS?

O Tribunal de Justiça de São Paulo possui entendimento pacificado e sumulado de que a ausência de previsão no rol da ANS é irrelevante e que o tratamento indicado pelo médico deve sempre prevalecer. Vide verbete 102 da súmula do TJ/SP:

Súmula 102: Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS.

A mesma coisa ocorre na 3ª turma do Superior Tribunal de Justiça, sendo pacificado o entendimento de que o rol da ANS é meramente exemplificativo.

O fato de o procedimento não constar do rol da ANS não afasta o dever de cobertura do plano de saúde, haja vista se tratar de rol meramente exemplificativo, não se admitindo restrição imposta no contrato de plano de saúde quanto à obtenção de tratamento necessário à completa recuperação da saúde do beneficiário.2

Contudo, o mesmo entendimento não é perfilado na 4ª turma do próprio Superior Tribunal de Justiça, o qual versa que a operadora de plano de saúde não é obrigada a pagar procedimento fora do rol da ANS, de forma que, inclusive, já afastou a aplicação do verbete 102 da súmula do TJ/SP.3

Em novembro de 2020, a 3ª turma do STJ novamente de pronunciou sobre o tema, de forma que ratificou seu entendimento e expôs sua contrariedade às decisões proferidas pela 4ª turma, senão vejamos:

2. A falta de previsão de material solicitado por médico, ou mesmo procedimento, no rol da ANS, não representa a exclusão tácita da cobertura contratual. 3. Em que pese a existência de precedente da eg. 4ª turma de que seria legítima a recusa de cobertura com base no rol de procedimentos mínimos da ANS, esta eg. 3ª turma, no julgamento do AgInt no REsp 1.829.583/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, julgado aos 22/6/20, reafirmou sua jurisprudência no sentido do caráter exemplificativo do referido rol de procedimentos.4

Desta forma, vemos que atualmente trata-se de uma loteria, havendo fundamentações e precedentes para ambas as partes, paciente e operadora de plano de saúde, entretanto, face o volume da negativas amparada por parte da jurisprudência e consequentemente o de ações geradas, não demorará muito tempo para que STJ fixe um entendimento único.

Fato é que, nesse meio tempo, não são poucos os consumidores/pacientes que se veem prejudicados pela demora excessiva na aprovação dos seus tratamentos, os quais muitas das vezes dependem de decisão externa para consegui-la, ou seja, do judiciário.

Outro ponto é que o rol da ANS deve ser atualizado com maior frequência, a fim de que diminuam os ajuizamentos de demandas e as negativas das operadoras de planos de saúde, já há tendencia no deferimento dos pleitos dos pacientes.

Por fim, a meu ver, o entendimento perfilado pela 3ª turma é o mais correto e que mais está em consonância com a Constituição da República, privilegiando o Direito à Vida e à saúde, bem como entendo que o rol deve ser considerado exemplificativo, uma vez que a partir de o momento que surgem novos tratamentos com eficácia comprovada cientificamente, estes não podem ser negados aos pacientes/consumidores.