Durante a pandemia, o sistema de saúde entrou em colapso em função da sobrecarga de demanda. Agora, o desafio é lidar com o impacto do excesso de demanda nas finanças da rede de atendimento. Essa é uma discussão que tem mobilizado o setor.

Nesta quinta-feira, dia 20, médicos, professores e representantes dos planos de saúde e de hospitais debateram como garantir a sustentabilidade do sistema de saúde no pós-pandemia, no Summit Saúde 2022.

De acordo com os especialistas, a situação atípica enfrentada pelo País – e pelo mundo – expôs a importância de tratar de forma integrada a saúde pública e particular, pois a dificuldade financeira de um impacta diretamente na do outro, especialmente com a transferência de demanda.

“Precisamos de políticas públicas para os setores público e privado. A pandemia mostrou muito claramente como os dois setores dependem um do outro e como é necessário ter uma estabilidade de contratos”, disse Walter Cintra Ferreira Júnior, professor de gestão de política de saúde da FGV-SP.

Ele destaca que a crise sanitária também evidenciou como o modelo de saúde no Brasil é “subfinanciado”. “O sistema de saúde inglês, com o qual o SUS costuma ser comparado, tem um investimento per capita em saúde de US$ 4.000, enquanto no Brasil é US$ 1.500. Precisamos ter um financiamento adequado para entregar o que é necessário à população”, disse.

Manoel Peres, presidente da Federação Nacional de Saúde Suplementar (Fenasaúde) e diretor presidente da Bradesco Saúde, lembra que as internações prolongadas e o grande número de exames e medicamentos elevaram de forma inédita o consumo dos serviços de saúde.

“Não podemos deixar de desconsiderar o custo elevado de assistência aos pacientes, especialmente em longa permanência, vale lembrar que houve falta, inclusive, de anestésico para intubação com o excesso de demanda. Como fazer para que o encontro de contas desse período crítico se reequilibre?”, questionou.

Ele diz acreditar que apenas uma “coalizão” entre prestadores de serviço, a rede de atendimento e o poder público pode garantir melhores modelos de remuneração aos prestadores de serviço e instituições, sem que os pacientes saiam prejudicados.

Daniel Greca, diretor de Saúde Populacional no Sírio Libanês, concorda. “Essa coalizão é necessária. Tudo que se refere a pós-pandemia, e orquestrar os cuidados, deve ser feito coletivamente. Operador, prestador de serviço, indústria… Se a gente não trabalha a cadeia de valor como um todo, pensando no paciente, fica muito complexo de fazer a transformação para um modelo mais sustentável”, defendeu.

Cadeia produtiva

O professor Salles reforça o diagnóstico de Greca, ao defender um olhar mais cuidadoso para a cadeia produtiva. De acordo com ele, o Brasil sempre foi referência na produção de vacinas e medicamentos, e isso se perdeu ao longo dos últimos anos.

O reflexo na pandemia foi uma grande dependência de insumos importados para a produção de imunizantes pelos laboratórios nacionais. “A sustentabilidade do setor passa por retomar a produção nacional perdida nos últimos anos, de medicamentos e mesmo vacinas, de modo a diminuir a dependência de insumos e itens importados”.

O presidente da Confederação das Santas Casas de Misericórdia e Hospitais Filantrópicos, Mirócles Véras, destacou a gravidade da situação das entidades filantrópicas. Veras citou o exemplo do custo de internação em UTI, na casa dos R$ 3.000 por dia, para reforçar com as despesas extraordinárias levaram as instituições a um déficit e a um endividamento ainda maior.

“As Santas Casas têm a função de servir, e hoje a nossa situação é muito difícil, não havendo uma contrapartida do poder público. Precisamos discutir uma nova forma de financiamento. A situação é grave e emergencial”, afirmou Véras.

Ele vai além ao dizer que as entidades filantrópicas estão fazendo “o papel do Estado”. “Se eles não estão remunerando o nosso procedimento, nós estamos bancando, através de endividamento, a saúde pública no Brasil. Essa estrutura tem que ser repensada de uma forma efetiva. A covid nos mostrou como está a saúde do Brasil, a necessidade de estarmos todos juntos estudando. É uma rede. A saúde está atrelada a tudo, especialmente à economia”.