Em meio à crise provocada pelas denúncias relativas à Prevent Sênior, que têm promovido um grande debate sobre modelos de saúde suplementar, qualidade e segurança do atendimento prestado por planos de saúde, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) inicia amanhã a fase final de teste do Programa de Monitoramento da Qualidade da Assistência Hospitalar, que começou a ser formatado em 2018.

O teste final da ferramenta será feito por 16 hospitais, entre eles o gaúcho Moinho de Ventos e os paulistas Hospital do Coração, Sírio-Libanês, Albert Einstein e Oswaldo Cruz, que contribuíram na elaboração do projeto. Mas será aberta já em l 9 de novembro a inscrição para que outras 376 unidades hospitalares de rede própria e credenciada das operadoras – com acreditação (certificação na área de saúde) – participem do programa, que deve se tornar uma nova fonte de informação para os clientes.

O monitoramento dos dados começa em janeiro e a previsão é que a primeira prévia dos 14 indicadores saia em junho de 2022. A classificação será em cinco faixas.

– A ideia é empoderar o consumidor para que faça melhores escolhas, e também criar uma nova cultura, direcionar o eixo da competição para a qualidade, com uma avaliação detalhada por unidade hospitalar, o que ainda não existe no país – diz Cesar Serra, diretor de Desenvolvimento Setorial substituto da ANS.

META É ALCANÇAR REDE TODA

Neste primeiro momento, a adesão ao programa é voluntária. Mas caso não haja uma adesão maciça, Serra avisa que a ANS tem instrumentos para tornar a participação obrigatória.

– Esse é um primeiro passo, mas a meta é estender esse programa a toda a rede prestadora de serviços da saúde suplementar, além de hospitais gerais, especializados, clínicas, laboratórios.

Na última semana, a Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) divulgou pela primeira vez os indicadores de seus 120 associados, mas ainda de forma agregada, sem informar resultado por unidade. O levantamento já era feito há 15 anos, mas apenas para informação dos associados. Antonio Britto, presidente da Anahp, diz que a iniciativa da ANS e da entidade não são excludentes e que é hora de quebrar tabus: – E hora de avançar em defesa da qualidade. Quanto mais indicador, melhor. Se quando se escolhe um hotel, restaurante, roupa há indicadores de qualidade para orientar o consumidor, como ao tratar da saúde vai ser diferente?

PROCESSO LENTO

A ANS precisa aumentar a velocidade de implementação de programas de qualificação dos prestadores da saúde suplementar, diz Wilson Shcolnik, presidente da Associação Brasileira de Medicina Diagnostica (Abramed):

– Há uma década a ANS vem discutindo qualificação, mas até agora esse programas ainda não mostraram grande efetividade. E preciso acelerar e dar os incentivos corretos para uma adesão maciça. Os hospitais são importantes, mas a maioria dos atendimentos aos consumidores são feitos em laboratórios e clínicas. Para se ter uma ideia, são mais de 12 bilhões de exames laboratoriais por ano.

Para Renato Casarotti, presidente Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), faz sentido o programa começar pelos hospitais já que respondem por 50% do custo dos planos. Ele avalia que a divulgação de indicadores é importante para esclarecer se há diferença na qualidade de unidades próprias e credenciadas: – Vai ser revelador. Além disso, permitirá às operadoras priorizar a alocação de recursos em unidades com os melhores desfechos.

FALTA INFORMAR PREÇOS

Para Vera Valente, diretora executiva da FenaSaúde, que reúne as maiores empresas do setor, o programa pode surpreender o consumidor, que avalia a rede credenciada baseado em reputação, sem conhecimento de dados técnicos:

– Hoje o consumidor avalia se um plano é bom ou não pelo fato de ter o hospital X no Rio e o Y em São Paulo, muito mais por reputação do que por dados. Essa avaliação pode mostrar que outras unidades que ele não conhece também têm boa qualidade.

Para o especialista em saúde pública Mário Scheffer, professor da faculdade de Medicina da USP, no entanto, o programa deixa de fora uma informação fundamental, o preço por procedimento. Ele pondera que poucos consumidores, atualmente, podem escolher planos por rede, a maioria fica com o que cabe no bolso:

– Como são esses custos que compõem a mensalidade, precisamos entender porque há tanta discrepância de preço entre procedimentos iguais, com desfechos semelhantes.

Para Ligia Bahia, do Instituto de Saúde Coletiva da UFRJ, a transparência do programa fica prejudicada por ter sido construído com os próprios hospitais. Ela defende que esse programa seja feito em parceria com universidades.