Nos Estados Unidos, é possível que operadoras de planos privados de saúde alterem o preço dos contratos a partir de uma seleção de risco. No caso das pessoas que não se vacinaram contra a Covid-19, após a aprovação definitiva do imunizante da Pfizer no país, foi iniciada uma discussão sobre a possibilidade de se cobrar mais caro delas. Mas, e no Brasil?

Na Resolução Normativa (RN) nº 162, de 2017, a Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) determina, em seu artigo 10º, parágrafo único, que não são permitidas por parte das operadoras perguntas sobre hábitos de vida, sintomas ou uso de medicamentos. Além disso, a Lei dos Planos de Saúde (Lei nº 9.656) estabelece que a operadora não pode, sob nenhum pretexto ou alegação, discriminar ou atender de forma diferente um consumidor.

“Falar em preço maior para quem não se vacina é a mesma coisa que falar em preço maior para quem não vai à academia ou fuma”, avalia a advogada Lidiane Mazzoni, especialista em regulação de planos de saúde e sócia do Mazzoni Advocacia. Ela explica que não pode haver discriminação nem com costumes, hábitos, idade ou doenças. Desta forma, não há como alterar preços, muito menos negar a entrada de um benefíciário não vacinado contra a Covid-19 no plano.

A Súmula Normativa nº 19/2011 também dispõe que a comercialização de planos privados, tanto na venda direta, quanto na mediada por terceiros, não pode desestimular, impedir ou dificultar o acesso de beneficiários em razão da idade, condição de saúde ou por portar deficiência – inclusive com a adoção de práticas ou políticas de comercialização restritivas direcionadas a estes consumidores.

A norma também proíbe a seleção de risco em qualquer tipo de contratação de planos e prevê que a discriminação consiste em infração à legislação dos planos privados de assistência à saúde, podendo a operadora ter sanções como advertência e multa no valor de R$ 50 mil.

O que pode acontecer, no caso de doenças ou lesões pré-existentes, é a imposição da Cobertura Parcial Temporária (CPT), que admite – por um período de até dois anos a partir da contratação do plano – que seja suspensa da cobertura os procedimentos de alta complexidade, leitos de alta tecnologia e procedimentos cirúrgicos, todos relacionados às doenças preexistentes declaradas pelo beneficiário. A situação está prevista na RN nº 162/2017.

Por exemplo, se um paciente infectado pela Covid-19 desenvolver uma doença, quando ele for contratar um plano, deve notificar a operadora, podendo sofrer a suspensão temporária daqueles tratamentos específicos.

Na visão do professor de economia do Insper, Thomas Conti, a cobrança de um valor maior de pessoas que não se vacinaram contra a Covid-19 faria sentido a partir de uma lógica econômica. “Como é um risco facilmente evitável, as vacinas são extremamente seguras, faz muito sentido econômico que os planos diferenciem esses esses preços. É uma vantagem para a carteira de segurados, para o mercado – porque reduz o risco de todos -, e para a gestão dos hospitais”, disse o professor. Para ele, também é um incentivo a mais para que as pessoas se vacinem.

Já Rogério Scarabel, advogado e ex-presidente da ANS, avalia que a diferenciação de preços de acordo com hábitos e costumes de cada beneficiário, pode ser prejudicial ao acesso à saúde e afirma também que não faria sentido, se tratando de planos de saúde, facilitar o acesso apenas para pessoas saudáveis.

Marcos Novais, superintendente executivo da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), afirma que o setor não iniciou e nem aparenta pretender começar uma discussão sobre o tema.